Crítica | O Grito – Origens
Base inspiradora dos eventos de “O Grito”, “Ju-On: Origins” se concentra no início da maldição que aterrorizou o mundo. Desmembrando a cadeia de horror que persegue os que entram em contato com a casa assombrada de Tóquio, a série original da Netflix tenta dar um novo fôlego ao clássico japonês.
Baseado nos medos pessoais de Takashi Shimizu, criador da franquia, Ju-On veio à público pela primeira vez em 1998. Direcionando suas intenções ao folclore japonês, a saga adaptou às telas a crença popular oriental nos “Onryō” – fantasmas capazes de causar danos ao mundo dos vivos – e apostou em um trama macabra, explícita e violenta – mais conhecida como “gore” – para revolucionar o gênero do terror. Sucesso absoluto, o projeto se expandiu e conquistou todas as partes do mundo, além de garantir sequências horripilantes em sua terra-natal e, logo depois, versões americanas perturbadoras que deram continuidade à saga sobrenatural.
Originalmente, a mitologia de Ju-On tem como foco uma maldição de uma casa em Tóquio. Na lenda japonesa, quando alguém morre vítima de um ódio violento, esse lugar torna-se impregnado com forças malignas que perseguem e matam quem quer que cruze o seu caminho. Procurando vingança para “corrigir” os erros que sofreu enquanto vivo, o conto japonês surge com a morte de Kayako. Mãe e esposa, a história conta que a mulher foi brutalmente assassinada pelo próprio marido, que descobriu o seu interesse em um outro homem. Furioso, ele também mata o seu filho e, no final, se suicida. Acometendo gerações, o palco desse crime sangrento – moldado no rancor que penetrou o coração da casa – se tornou o lugar mais assombrado do Japão.
“Ju-On: Origins” retrata o nascimento desse mal.
Parte de um crescente investimento da Netflix em conteúdos de língua estrangeira, “Ju-On: Origins” tem início quando Yasuo Odajima (Yoshiyoshi Arakawa), um investigador paranormal, examina sons estranhos vindos da casa de Haruka Honjo (Yuina Kuroshima), uma estrela de TV. Descobrindo uma trilha de pistas horripilantes que conectam a moça à uma misteriosa casa, os dois tornam-se vítimas de uma poderosa maldição. Marcados, a dupla tenta sobreviver aos eventos sobrenaturais que insistem em rodeá-los, enquanto procuram decifrar as raízes do mal impregnado na residência mais desgraçada de Tóquio.
Perturbadora, a nova produção japonesa da Netflix se diferencia ao apostar em uma trama sinistra e em uma violência bastante gráfica – fazendo jus aos seus antecessores. Seguindo o mesmo caminho que sacramentou “The Grudge” como um dos maiores horrores de todos os tempos, a produção enoja e atiça a curiosidade ao mesmo tempo – principalmente quando um dos personagens utiliza uma faca de cozinha para retirar um bebê do corpo de um cadáver. A ideia original da série incrementa a mitologia maligna por detrás da história e, em um primeiro momento, mantém o interesse do público. No entanto, a aposta quase crua no gore se revela como o caminho fácil escolhido pela produção para tentar disfarçar a falta de criatividade da série e as sucessivas escolhas erradas que tornaram-na, infelizmente, um devaneio inadequado.
Insuficiente para esconder as enormes falhas de “O Grito: Origens“, o horror fúnebre – utilizado como pano de fundo da série – agrada, mas não desvia a atenção do público de certas questões desastrosas e problemáticas. Investindo em saltos temporais sem sentido e em situações forçadas, o espectador, desde o início, fica confuso com a teia narrativa mal planejada e desconexa que é apresentada. Dessa forma, a partir do momento que o público começa a formular o mínimo esboço dos acontecimentos em tela, o último episódio já teve fim e deixou um gosto amargo que poucos irão repetir. A frustração é crescente e o desejo marcante é que a franquia “Ju-On” se resumisse aos filmes.
Regurgitando ideias ruins, a série, como se não bastasse, nos obriga a conhecer personagens desleixados e sem profundidade que tentam, sucessivamente, chamar a atenção de maneira constrangedora. Pecando no desenvolvimento de papéis – que impossibilita o espectador de criar qualquer tipo de vínculo com a história -, “Origins” também consegue ser negligente ao uso de cliffhangers – recurso narrativo que indica um final em aberto -, de modo a oferecer capítulos com finais súbitos e sem emoção, que decrescem cada vez mais a vontade de iniciar o próximo episódio.
Definitivamente popular, a mitologia de “Ju-On” provou ainda ter histórias para explorar. No entanto, mergulhando raso na revitalização da franquia, a série diverge da qualidade esperada – e anteriormente apresentada pelos filmes – para entregar uma tentativa malsucedida de impressionar. Decepcionante, a trama perde-se em suas atrocidades e não consegue convencer. Por fim, apesar de inicialmente atrativa, “O Grito: Origens” não é capaz de deixar marcas consideráveis no espectador e, aproximando-se da carniça podre que insiste em documentar, transforma a maldição da casa mais assombrada de Tóquio em uma jornada desagradável e enjoativa.
“O Grito: Origens” está disponível na Netflix.
Nota: 1,5/5
Assista ao trailer:
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