Oscar 2021 | Minari — Como assim uma Avó que xinga e não faz biscoitos?
O encontro entre duas gerações sempre rende tramas sobre aprendizado e desconstrução de ideais. Durante anos, simbolizado na figura do “Mestre” e do “Aluno”, tal relação foi explorada em diversos roteiros que abordaram o choque entre o mundo dos mais velhos e o mundo dos mais jovens. Essa é a premissa que pulsa no coração narrativo de Minari ao explorar a conexão entre “avó” e “neto”.
Na literatura nacional há uma vovó com “cestinha de costura ao colo e óculos de ouro na ponta do nariz” que todos conhecem. Além de residir em um famoso sítio, Dona Benta tornou-se um referencial imagético para muitos, como a avó carinhosa, gentil, conselheira e que sabe fazer os quitutes mais saborosos. Mas, vez ou outra, o cinema e a TV retratam outros perfis, desconstruindo o modelo da vovó perfeita. No filme A Proposta, comédia romântica de 2009, a atriz Betty White encarnou uma senhora para lá de diferente. A avó Shige, de Meus Vizinhos, os Yamadas (obra do falecido diretor Isao Takahata), também foi na contramão dessa imagem generalizada.
Agora, em 2021, essa desconstrução tem nome e rosto: Soon-Ja. Conhecida como a “Vovó Desbocada” de Minari, a personagem ganhou vida nas mãos da veterana Yuh-Jung Youn. A artista sul-coreana é a grande aposta para arrematar a estatueta dourada como Melhor Atriz Coadjuvante. Inclusive, minha torcida vai para ela.
Sem papas na língua, a vovó Soon-Ja não é apenas uma estrangeira no coração do Arkansas. Para as crianças, ela é uma desconhecida que morará sob o mesmo teto. Para a filha, a presença de sua mãe é uma ponte que a conecta com suas raízes; e para muitos espectadores, ela é o grande destaque do filme, roubando a cena toda vez que surge na tela. Ainda que fuja da representação de avó que muitos conhecem, ela traz algo em sua bagagem ao chegar na casa de sua família: carinho.
Se em uma ponta temos a avó desbocada, na outra está o neto com a mesma característica. O garoto, chamado David, diz “Você nem é vovó de verdade. Pois, elas fazem biscoitos. Elas não xingam!“. Para ele, a senhora que está dormindo em seu quarto e roncando todas as noites não corresponde suas expectativas. Frustrado, ele trilha um caminho para entender que sua avó tem outras peculiaridades, como fazer piadas e zombar dos netos em um jogo de cartas.
O carisma que emana do personagem é fruto da direção cuidadosa que o cineasta Lee Isaac Chung teve com o ator mirim Alan S. Kim, explorando a inocente sinceridade do jovem. Não é à toa que o garotinho fez muitos chorarem e sorrirem quando ele foi premiado com o Critic’s Choice Awards. Veja:
Apesar da temática acerca do “sonho americano” pela óptica de uma família coreana, Minari entrega o que tem de melhor nessa relação entre avó e neto. O choque entre a experiência e a inocência travessa gera momentos inesquecíveis. Uma hora você está sorrindo, depois gargalhando e no fim seus olhos estão borrados pelas lágrimas. É uma convivência tão sincera e pura que muitos terminarão o filme querendo adotar a “Avó Desbocada”. Vovó Soon-Ja pode não ser o modelo ideal de “mestre” e tudo bem, afinal, seu neto não é um pupilo convencional. Mas, mesmo com essa dinâmica incomum, eles encontram tempo para aprender um com o outro.
Mães são nossas primeiras super-heroínas. Elas defendem, ensinam e motivam. Logo, a mãe da nossa mãe é tudo isso em dobro. Por mais que muita gente propague a frase “não existe nada melhor que almoço feito pela avó, em uma tarde de domingo“, nem todas elas são resumidas em tais palavras, afinal existem outras formas de demonstrar amor. Minari está aí para provar isso.
O filme recebeu 6 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Melhor Atriz Coadjuvante, Melhor Ator, Melhor Direção, Melhor Roteiro Original e Melhor Trilha Sonora Original.
Assista ao trailer:
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