Como as Trilogias da Guerra, Europa e da Frieza, conversam com o mundo contemporâneo
Para os amantes de trilogias cinematográficas, é necessário abordar algumas que vão além do blockbuster e mainstream. Trilogias que foram dirigidas e roteirizadas por grandes nomes da história cinematográfica, sendo os nomes dos diretores em pauta nesse texto: Roberto Rossellini, Lars Von Trier e Michael Haneke. Claro que existe uma grande diferença de tempo em que a trilogia da Guerra foi lançada, em comparação com as de Lars e Haneke. Porém, essa mudança cronológica não só não atrapalha tais comparações a seguir, mas as complementa em variáveis facetas sobre pontos históricos e sociais da humanidade, resultando o momento presente que esse texto se encontra.
Quando Rossellini cria tal trilogia, que marca o movimento neo-realismo italiano, o diretor faz questão de demonstrar variadas camadas sobre as consequências da segunda guerra mundial entre os países Itália e Alemanha (Alemanha, ano zero e Roma cidade Aberta) e os detalhes sobre o pós conflito, em diferentes visões. Proposta que o diretor executa no último filme da trilogia, Paisà.
Na trilogia da Guerra, Rossellini não foge da crueldade e do pessimismo dentro do cenário presente e pós da Segunda Guerra Mundial ao povo europeu. Mostrando cenários de extrema pobreza, violência, fome, entre outros. Necessário acentuar que Rossellini não prática a direção para abordar tais pontos de forma sensacionalista, mas realística. Realismo que conversa com o cenário de uma cidade, realmente, destruída por consequência do conflito.
Mas oque a proposta de Rossellini pode ter a ver com as trilogias dirigidas por Lars Von Trier e Michael Haneke? Principalmente, pela forma completamente diferente que os três diretores dirigem seus próprios filmes. Lars decide fazer uma trilogia envolvendo questões divergentes, sendo foco na segunda guerra mundial(Europa), até um filme com estilo noir(A Element of Crime) e metalinguagem cinematográfica(Epidemic). Lars sempre fez questão de enfatizar o caos dentro de qual for o cenário proposto, e ele faz questão de injetar caos nos protagonistas de sua trilogia, fazendo com que: a narrativa não se torna o primordial em sua obra, mas a psicologia e a mentalidade perturbada em que seus personagem se afundam ao longo desse cenário sujo, grotesco e imoral.
A ideia de discutir a hipocrisia puritana do ser humano, no ambiente que o próprio habita, é uma assinatura natural do trabalho do diretor, até mesmo fora sua trilogia. Mas, diferente de Rossellini, Lars quer mostrar a figura humana caótica em 3 tempos diferentes: seja em Europa(Segunda Guerra Mundial), Epidemic (Anos 90) e A Element of Crime(Distopia de um espaço incerto), que mostram o reflexo mais próximo de um pessimismo sobre o ser humano quanto ao próximo e ao ambiente que tais indivíduos habitam.
Em ambas as trilogias, existe um diálogo sobre a figura horrenda sobre a capacidade do ser humano de afetar tudo aquilo que há a sua volta, seja um próximo, ou mesmo no quesito territorial. E é nesse ponto que acontece a diferenciação de ambas trilogias com a do diretor Michael Haneke. Pois Haneke não quer falar do terror, e do caos que envolve o mundo inteiro em conjunto com o sujeito, mas o terror intrínseco e nas entrelinhas de um único indivíduo. Indivíduo que vive em um ambiente frio e pouco caótico como os propostos pelas outras trilogias citadas. Aqui, o humano vive o caos dentro de si e o executa de forma silenciosa.
Na trilogia da Frieza, as obras mostram de forma delicada a vida de seus protagonistas, seja no dia a dia com a família(O Sétimo Continente), seja na relação do indivíduo com suas fitas cacetes e câmeras(O Vídeo de Benny), ou em momentos que resultam em algo aterrorizante, pelo simples acaso(71 Fragmentos de uma Cronologia do Acaso). Pegamos um cenário bastante diferenciado do que foi a produção de Rossellini, saindo de um pós-guerra e com outra técnica em capturar tais cenários, coloco o leitor para a Dinamarca quieta, sem crises por conflito, saúde ou pobreza, mas um quieta e fria.
Diferente de um cenário proposto pelas trilogias anteriores, de um terror sempre pairando sobre o protagonista e os outros personagens, temos o incômodo e o medo de não saber quando e como esse terror vai aparecer para os olhos do espectador. Oque acontece de forma sutil e aos poucos, colocando o espectador em uma tensão de um caos confinado nesse espaço tão minúsculo, que podem ser dois jovens vivendo suas vidas normais, ou uma família monossilábica entre si mesma, mas vivendo um vida simplesmente normal.
É necessário pontuar o filme O Sétimo Continente, que mostra o simples ato de acabar com aquele inferno no qual os personagens vivem diariamente, e que não encontram sentido em sua presença naquele espaço. Algo que se difere das trilogias de Rossellini e Lars, onde o personagem está completamente voltado em conseguir resolver oque tem que resolver e sobreviver. O cenário de Haneke é o medo e a repulsa de um presente vázio e sem sentido para os presentes em suas respectivas estórias. Não a toa, o som e o ambiente se expressam muito mais que os próprios personagens em suas narrativas.
As trilogias pautadas para o texto presente, executam a função de mostrar ao espectador como o caos criado pelo próprio ser humano nunca deixou de existir, mas evoluiu até o sentido microscópico. De cenários apocalípticos demonstrados pelas guerras, até a repetição desse caos em diferentes tempos, até o terror e o horror que habita em silêncio dentro de residências de famílias e quartos de estudantes que nunca mostraram nada de suspeito sobre todo o horror que o ser humano sempre está, e estará, disposto em fazer. Seja ele mínimo, o caos humano ainda existe, mas de forma sorrateira e pronto para se mostrar, quando menos se espera.
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