CRÍTICA| Acompanhante perfeita é uma boa iteração de diversos bons filmes

perfeita

Dirigido por Drew Hancock, Acompanhante Perfeita junta relacionamentos abusivos e IA em um belo entretenimento

Obs: A seguinte crítica contém spoilers de Acompanhante Perfeita.

A palavra robô é derivada da palavra checa “robota”, que significa, em poucas palavras, “trabalho escravo”. Eles são pessoas obrigadas a servir aos seus mestres, do mesmo modo que os escravos antigamente na Grécia Antiga, ou no período de colonização da América.

Em pleno 2025, esta noção de tecnologia foi muito ampliada, principalmente por conta de uma IA que já dominou nossas vidas, e que atua de modo tão fácil que não sabemos mais quem é o escravo e quem é o mestre. O cinema já explorou os males desta tecnologia em diversos filmes como 2001: Uma Odisseia No Espaço (1968, Stanley Kubrick), Ex-Machina (2015, Alex Garland), Blade Runner 2049 (2017, Dennis Villeneuve), Meg3n (2022, Gerard Johnstone), e a série Westworld (2016-2022, Jonathan Nolan e Lisa Joy), produções que mostraram inclusive a tomada de consciência dos andróides e sua “vingança” contra humanos.

A soma do conteúdo narrativo de todas estas produções origina Acompanhante Perfeita, colocando em prática uma interessante discussão que encontramos no filme Herege (2024, Scott Beck e Brian Woods), coincidentemente, também com Sophie Tatcher.

Acompanhante Perfeita não é um filme original, ele é o bisneto de tudo que veio antes, que foi comido, mastigado, engolido e regurgitado de uma forma quase antropofágica. A produção aprende com os erros de seus antecessores, pega seus pontos fortes e tenta se destacar por si mesmo, apresentando características únicas e muitas, mas, muitas semelhanças com cenas e momentos que já vimos mais de uma vez no cinema.

Acompanhante Perfeita é a história do namoro de Josh, Jack Quaid, e Íris, Sophie Tatcher. Nossa compreensão muda quando descobrimos que Íris é uma andróide acompanhante e que todas as suas memórias foram fabricadas com o intuito de criar um vínculo com o seu dono/namorado. Esta história parece familiar, não é?

Acompanhante Perfeita

Sophie Tatcher e Jack Quaid em cena de Acompanhante Perfeita- Divulgação Warner Bros Pictures

Enquanto a primeira camada de iterações gira em torno de filmes sobre inteligência artificial tomando consciência, a partir deste momento Acompanhante Perfeita inicia uma segunda camada de iterações que discute relacionamento abusivo de maneira semelhante à Ruby Sparks (2012, Valerie Faries e Jonathan Dayton), em questão do controle que o namorado tem sobre sua “criação”, e filmes como Casamento Sangrento (2019, Tyler Gillet e Matt Bettinelli-Olpan) , em que uma jovem mulher é perseguida por todos os outros personagens que tentam matá-la, e deve se defender sozinha.

Acompanhante perfeita é um bom filme na medida que mistura comédia, ficção científica e thriller, porém, não consigo parar de pensar que todas as discussões e reviravoltas de seu roteiro, já foram exploradas anteriormente. O que realmente faz Acompanhante Perfeita se destacar dentro deste amplo mar, é a sua estética e o seu timing.

O filme estreará nos EUA no dia 30 de Janeiro de 2025, duas semanas antes de um dos maiores feriados do país no dia 14 de Fevereiro: Valentine’s Day. Somando isso, a uma produção que apresentou um marketing extremamente carinhoso e fofo, com cartazes rosas espalhados que prometem um belo romance, a Warner Bros Pictures, pretende usar o pastiche de Acompanhante Perfeita para atrair a atenção de diversos casais que buscarão um entretenimento para seus encontros.

Remetendo a uma estética nostálgica dos anos 1950, principalmente em sua cena inicial, a produção abraça um pastiche e um sentimento lúdico e idealizado, tudo está muito bem, apesar do caos que está ocorrendo, as atuações segura muito neste quesito, nada parece muito absurdo para aquele universo, e quando parece, é cômico. Íris corre pelas matas descalça e com a roupa toda ensanguentada, tenta fugir quebrando o vidro da polícia, e mesmo assim, Sophie Tatcher a constrói de tal maneira que ela continua tão perfeita quanto, não importa o quanto ela esteja sofrendo, ela sempre tem um plano.

Acompanhante Perfeita

Sophie Tatcher em Acompanhante Perfeita- Divulgação Warner Bros Pictures

A cena de maior destaque neste filme é a discussão final entre Josh e Íris. Jack Quaid consegue carregar em um longo monólogo, toda a representação do nice guy, alguém que se enxerga intitulado a ter tudo o que sempre quis, justamente por ser uma pessoa boa, ou melhor, se achar uma pessoa boa. Esta cena é a piece de resistance de Acompanhante Perfeita, por conta dela falar com a sombra que existe em cada um de nós, principalmente nos homens. Um sentimento que muitos sentem e que caso deixe esta dor sair, pode ter consequências catastróficas para si e para todos ao seu redor.

Não escondendo que é um filme independente, e muito menos original, Acompanhante Perfeita é um arroz com feijão bem feito e um entretenimento depretensioso. Com grande destaque para Sophie Tatcher e o seu lindo sorriso, um roteiro redondo que prende e surpreende o espectador ao mixar a narrativa clássica com reflexões que apesar de sutis, podem gerar discussões futuras, uma comédia auxiliada pela técnica do pastiche e trocas rápidas de interações, e por fim uma fotografia e uma arte cuidadosa e de destaque, permitindo um entretenimento e um agrado visual para o espectador.

Um destaque também para o pessoal de marketing que conseguiu instigar a curiosidade do espectador de maneiras bem mais interessantes do que estragar de primeira a maior surpresa do filme: a natureza andróide de Íris. Vendendo a produção como um romance de terror e deixando as maiores surpresas para quando as pessoas forem assistir o filme.

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