Crítica | Pam e Tommy – série acerta em mobilizar acolhimento, mas expõe Pamela novamente, sem permissão
Pam e Tommy, série disponível no Star Plus, encerra a história real da primeira sex tape divulgada sem permissão, em uma época em que a rede mundial de computadores ainda estava em seus primeiros passos. E apesar de mostrar em seus oito capítulos quem realmente sofreu com toda a repercussão negativa desse compartilhamento criminoso, ao expor novamente todo o trauma pelos julgamentos sofridos na época, não permitiu que a vítima principal, a atriz Pamela Anderson tenha sua história contada com sua permissão. Pamela Anderson já anunciou em suas redes sociais que contará sua verdadeira história em documentário a ser lançado pela Netflix.
Tudo o que foi discutido nas primeiras impressões sobre a série Pam e Tommy foi confirmado e não tinha como ser diferente. Em toda e qualquer situação vexatória de divulgação de cenas íntimas, como vingança, de forma criminosa ou com intuitos midiáticos a parte que mais sofre por ser mais condenada, ridicularizada e julgada de forma errada é a mulher. E o caso de Pamela, considerado o primeiro a ter grande repercussão por envolver famosos e acontecer no início da internet serve até como recorte exemplificativo do que mudou e do que não mudou em termos comportamentais, tecnológicos e jurídicos sobre o assunto.
Todas as cenas íntimas que teve que encenar junto ao ator Sebastian Stan, podem ser consideradas um tanto quanto desnecessárias se o objetivo era oferecer redenção tardia ao que ocorreu com Pamela. Pamela e Tommy Lee eram um casal de atitudes e demonstrações de amor e paixão extremas e intensas, como qualquer arquivo de jornais e revistas norte americanos pode relembrar com uma simples busca na internet. Mas, como já comentado, a atriz não autorizou o uso de sua história para as filmagens desta série.
Se, apesar de tratarem a exposição de sua história com o respeito que ela sempre mereceu, reforçarem o estereótipo que muitos podem usar como argumento para falar que a atriz estava de acordo com toda a situação, a série poderia perder sua razão de existir. Felizmente as cenas em questão foram utilizadas somente para explicar, mesmo que de forma explícita, o que acontecia entre o casal e a partir da exibição de novos episódios o foco se transforma em: e agora, como podemos lidar com tudo isso?
E não se pode negar, Lily James brilhou em seu papel como Pamela. A caracterização da atriz para viver o papel funcionou perfeitamente e por vezes esquecemos que é a Lily que está ali, não a própria Pamela Anderson. E a atuação foi impecável em todos os momentos. As cenas em que teve que mostrar o desconforto que Pamela sentia a cada insinuação desrespeitosa que recebia de advogados, apresentadores de televisão e mídia nos faz questionar até que ponto o tratamento que mulheres vítimas de violações sexuais ou morais evoluiu ou regrediu com o passar dos anos.
Nos momentos em que Lily expôs a tristeza que debilitava Pamela a cada negativa de novos trabalhos em filmes ou negativas de publicações em revistas femininas e a dor que não conseguimos nem mensurar ao ser violada em sua privacidade e ainda ter que fingir estar bem quando mostravam a ela trechos da fita, questionando-a sobre seu passado em uma clara tentativa de “culpabilização” da vítima. É inevitável, acabamos por finalmente acolher Pamela depois de tudo o que ela sofreu. A série foi brilhante em apontar o dedo na cara de todos os responsáveis por espalhar ou repercutir de forma direta ou indireta a fita roubada que causou tantos transtornos na vida de uma atriz em ascensão.
Os outros envolvidos no escândalo são igualmente bem representados. Sebastian Stan já é querido do público por conta de seus trabalhos anteriores em filmes de super herói e empresta essa simpatia na sua representação de Tommy Lee. E essa simpatia é bem necessária em certas partes da narrativa, pois por diversas vezes o comportamento agressivo de Tommy em relação às frustações que ocorriam ao seu redor durante a grande repercussão da fita vazada, vem à tona. E é preciso muito jogo de cintura pra contornar o aspecto negativo de cada um desses momentos e ainda assim se mostrar interessante para a audiência. E Sebastian consegue com muita maestria.
O marceneiro Rand Gauthier, grande responsável pelo furto e posterior divulgação da fita na indústria de filmes pornô e na internet, é interpretado por Seth Rogen. E Seth consegue interpretá-lo sem trazer à ele a carga dramática de vítima ou de merecedor de empatia do público. Rand é caracterizado como um ser humano em busca de seu alinhamento com o Karma que, diante de uma situação de conflito, não prevê a consequência de seus atos e tenta uma forma de prejudicar Tommy Lee com tudo o que tiver ao seu alcance, se beneficiando com isso.
O comportamento de Rand( Seth Rogen) não conquista o público que estiver assistindo Pam e Tommy, e é exatamente esse o objetivo. É como um grande letreiro de aviso: Nunca trate mal as pessoas que trabalham para você/ Tome cuidado para não prejudicar pessoas que nada tenham a ver com sua frustração.
Outras figuras muito conhecidas do público são apresentadas nos episódios finais de Pam e Tommy, Jay Leno em sua patética entrevista com Pamela no programa The Tonight Show e o empresário Hugh Hefner, fundador da revista playboy que foi um dos entusiastas da carreira fotográfica e midiática da jovem Pamela Anderson. Dois momentos emblemáticos que mereceram atenção na série e mostram, através de comportamentos contrastantes, a forma como tratavam Pamela e seu direito de mostrar seu corpo da forma que preferisse sem que isso desse o direito da mídia a tratar como alguém indigna de respeito. Como fizeram por anos.
Apesar de todos os méritos da série Pam e Tommy, Pamela sequer foi consultada ou deu aval para que esta série pudesse existir. Mesmo que a imagem da atriz tenta sido tratada com respeito, inspirando acolhimento e respeito a verdadeira vítima da história, lançar algo sobre um episódio traumático da vida de alguém sem sua permissão não é nada respeitoso. Sem contar na ironia deste evento traumático ter se originado de uma divulgação também não autorizada de algo bastante pessoal como um vídeo caseiro de sexo entre marido e mulher.
Pamela Anderson divulgou em suas redes sociais que sua verdadeira história será contada em um documentário, já em produção pela plataforma de streaming Netflix. Nas palavras escritas pela própria atriz : “Minha vida. Mil imperfeições. Um milhão de percepções equivocadas. Cruel, selvagem e perdida. Nenhuma expectativa. Eu só posso te surpreender. Não sou uma vítima, mas sim uma sobrevivente. E viva para te contar a história real”.
Agora, com o poder de narrar e com ganho financeiro consentido sobre isso, Pamela estará livre pra nos contar sua história. E o telespectador pode escolher se quer saber primeiro pela série Pam e Tommy através da interpretação de atores como Lily James, Sebastian Stan, Seth Rogen e grande elenco ou se prefere esperar para ouvir diretamente de Pamela Anderson.
Pam e Tommy é uma excelente série que só peca por cometer o mesmo erro que Rand Gauthier, mas se redime em termos por dar a Pamela a deixa para que ela possa escrever publicamente sua própria versão.
A temporada completa de Pam e Tommy já está disponível no Star +.
Nota: 5/5
Assista ao trailer:
Leia também :
Primeiras Impressões | Pam e Tommy
Crítica | Space Force (2ª temporada) – Série até tenta, mas não decola
Deixe um comentário
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.