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Crítica | Yakusoku no Neverland – 1ª Temporada explora a rebelião na “Terra do Nunca”

Anime adapta com muita competência as páginas sombrias e fantásticas do mangá, impressionando com a qualidade visual e a trama frenética regida por personagens imprevisíveis e carismáticos.

O universo audiovisual transformou-se com o nascimento dos serviços de streamings, impactando diretamente no comportamento dos usuários. Uma característica forte que todo assinante da Netflix adquiriu foi o hábito de “maratonar séries”, consumindo uma temporada completa em uma semana, às vezes em um período menor! Essa prática é maximizada quando aliada a uma produção de alta qualidade, que possuí ganchos no final de cada episódio impossíveis de ignorar. Isso acontece com Yakusoku no Neverland — também conhecido por The Promised Neverland — fantasioso e sombrio na medida certa, esse é um anime propício para uma boa “maratona”.

Sinopse Yakusoku no Neverland:

Emma é uma órfã que vive no orfanato Grace Field House junto com outros órfãos. Dentre todos eles, Emma, Norman e Ray são os mais velhos e os únicos que ​​conseguem as pontuações mais altas em testes. Emma observa que, enquanto eles são capazes de fazer o que querem, não podem sair do orfanato para irem ao mundo exterior. No entanto, eles ficam chocados ao descobrirem que a casa onde vivem é na verdade uma fazenda onde eles são criados e colhidos para se tornarem alimentos de criaturas demoníacas.

Yakusoku no Neverland 1ª Temporada
Yakusoku no Neverland / CloverWorks / Netflix

No começo de 2019, Yakusoku no Neverland estreou lá no ocidente convertendo, aproximadamente, as páginas de 36 volumes do manga e condensando tudo em uma temporada com 12 episódios. Agora, a história das crianças inteligentes que enfrentam monstros (humanos e demônios) ganha espaço no rol de animes da líder dos streamings.

Há uma semelhança estrutural na organização de personagens em Yakusoku no Neverland que já configurou outras obras, tanto no cinema, quanto na TV. O famoso “trio de protagonistas” é uma fórmula predominante e podemos enxergá-la, tal como na saga do bruxo mais famoso do mundo com Harry, Hermione e Rony. Nos desenhos é ainda mais forte como em As Meninas Superpoderosas, Três Espiãs Demais, Du, Edu e Dudu e muitos outros. No âmbito dos animes, isso se repete na história do “Ninja Número Um, Hiperativo e Cabeça-oca” com Sakura, Sasuke e Naruto.

No anime em questão, Emma, Norman e Ray são os protagonista de uma narrativa que os coloca como principais rostos de um microcosmo cercado por mistérios. O que a 1ª temporada faz com excelência é administrar o suspense em doses certas, nos entregando o necessário e “alimentando” nossa percepção com possibilidades surreais. Como espectador, nossa visão de mundo fica limitada, assim como acontece com os personagens. E a cada descoberta que abala o pequeno mundo deles, somos bombardeados por verdades cruéis demais. A sensação de que o pior passou nunca vem, pois a presença do perigo é constante.

Yakusoku no Neverland 1ª Temporada
Yakusoku no Neverland / CloverWorks / Netflix

Desenvolvendo a história em um orfanato que segue um rígido sistema de aplicação de testes intelectuais, a direção de Mamoru Kanbe (que trabalhou em Elfen lied) é impecável e detalhista, transformando as pequenas adversidades dos personagens em momentos tensos, beirando o horripilante. É como um jogo de “gato e rato” travado silenciosamente; nenhum dos lados pode revelar o que sabe. Por isso os confrontos acontecem sob um véu de aparências, as peças se movendo nas sombras.

Mamoru “cortou” alguns acontecimentos do manga, tornando a narrativa mais rápida e sem tempo para respiros. Dependendo do contexto, isso pode soar negativo ou positivo. Para aqueles que nunca tiveram contato com o manga, isso não será um problema, por outro lado, os que devoraram cada volume do material original podem sentir que a história ficou “corrida”.

Yakusoku no Neverland 1ª Temporada
Yakusoku no Neverland / CloverWorks / Netflix

A grande sacada do diretor foi potencializar os elementos fantásticos e de terror. O resultado é uma trama que equilibra com perfeição o suspense, a ação e o drama. Decerto você será iludido e impressionado por esperar um acontecimento “x”, que na verdade muda, abruptamente, para uma reviravolta “y”. Os plot twists caem na narrativa com uma bomba, explodindo impasses para todos os lados, a todo momento.

Yakusoku no Neverland tem uma característica chave. Usar os ambientes internos e externos como chamariz, manipulando nossa curiosidade. Se além dos muros que cercam o orfanato estão mistérios intrigantes, dentro das paredes do orfanato não é diferente. Um livro, uma porta, uma caneta. Objetos e cômodos tornam-se fundamentais para mover o enredo em um jogo arriscado de perguntas e respostas.

Yakusoku no Neverland 1ª Temporada
Yakusoku no Neverland / CloverWorks / Netflix

Duas personagens adultas são responsáveis pelas principais viradas na história: a Irmã Krone e a “mama” (Isabella). Acorrentadas em segredos, elas não só antagonizam a trama, como também possuem seu próprio jogo de “gato e rato”. Em suma, nunca sabemos quem pode ser aliado, traidor ou uma potencial ameaça, e, é ai que mora a diversão.

Emma, a protagonista de cabelo claro e arrepiado (favor não confundir com o Naruto!) é uma líder natural que assume as rédeas de um plano insano. Dela partem escolhas impregnadas de esperança, otimismo e coragem, assim como falhas e incompreensões lógicas. Norman é o pilar altruísta do trio, sempre pensando três passos à frente dos outros; o que ele tem de astúcia, ele tem de bondade, qualidades que quando misturadas o tornam um dos personagens mais cruciais da história. Ray é o personagem frio, às vezes distante, mas tão sagaz quanto os outros. Se Emma pode ser comparada ao Naruto, podemos dizer que o Ray é “quase” um Sasuke (quase!).

Yakusoku no Neverland 1ª Temporada
Yakusoku no Neverland / CloverWorks / Netflix

Aos três destina-se o peso de manipular os acontecimentos, enquanto buscam uma chance de liberdade para todos no orfanato. Quanto as demais crianças, nenhuma deles é um peso morto e o mirabolante roteiro consegue aproveitar o potencial de cada um para que eles tenham “um momento”. Engana-se quem acredita que são crianças “bobas”, o que eles tem de pequenos, eles tem de espertos. A princípio, somos enganados pela ingenuidade que brilha no olho de cada um, para minutos depois ficarmos embasbacados pelo nível de perspicácia que existe neles. Não pisque, não se distraia. Cada detalhe, cada movimento, tudo é arquitetado para um propósito maior.

A estética visual adotada pelo estúdio CloverWorks é banhada por referências as histórias de fantasia que marcaram nossa infância como Alice no País das Maravilhas, Pinóquio e Peter Pan. O uso predominante de luz e sombras torna o jogo da narrativa visualmente deslumbrante, Kazuaki Shimada é o artista por trás do design de personagens e seus traços conseguem fidelizar cada linha das páginas do manga. Além disso, ele aproveita as peculiaridades de algumas figuras para exagerar nas expressões faciais assustadoras, algo que me fez lembrar dos personagens de Kakegurui (com menos bizarrices, claro).

Yakusoku no Neverland 1ª Temporada
Yakusoku no Neverland / CloverWorks / Netflix

Yakusoku no Neverland é daqueles animes que te pega pela mão e te conduz por um caminho viciante e cheio de perigos. Você não apenas compra a ideia, como sofre a cada episódio, cria teorias sobre o que vem a seguir e, essencialmente, é surpreendido a todo momento. Com um senso de urgência que conduz tramas que envolvem “escapar” de um lugar, a obra sabe brincar com a quebra de sua cronologia narrativa, enganando nossos olhos e manipulando nossa percepção.

Com personagens profundos e uma trama que parece ter vindo de uma mente cuja missão é magnetizar nossa atenção, a 1ª temporada sabe onde quer chegar e quando finalmente alcança esse objetivo, nos resta apenas a ansiedade para um novo ciclo.

Sinistro como um filme de terror, extraordinário como as fantasias mais emblemáticas e enérgico como um game de ação, Yakusoku no Neverland é uma promessa que cumpre seu propósito: cativar e assustar. Talvez não nessa ordem, mas, certamente, na mesma intensidade.

Nota: 4,5/5

Assista ao trailer:

Veja também: Crítica | Lúcifer – 5ª temporada [Parte 1].

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