CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Herege é uma aula de filosofia e depois um filme de terror
Dirigido por Scott Beck e Bryan Woods, Herege se utiliza de símbolos para construir reflexões sobre crenças e fé
Aqueles que assistirem Herege esperando um filme de terror puro e simples, provavelmente sairão decepcionados. O filme apresenta um ritmo lento, focando muito em diálogos e auxiliado por uma fotografia de destaque, marca de filmes da produtora A24.
Desde o primeiro plano de Herege, é demonstrado o quanto o ser humano é pequeno em comparação ao mundo, enfatizando uma enorme montanha ao fundo e as duas protagonistas em primeiro plano: Irmã Barnes, Sophie Tatcher, e a Irmã Paxton, Chloe East. Quando estas jovens missionárias são obrigadas a participar de um jogo filosófico na casa de Mr Reed, Hugh Grant, ambas são obrigadas a testar sua fé, enquanto a audiência se diverte com reflexões que variam desde relações entre Monopoly e Judaísmo, até as comparações rítmicas entre as músicas The Air That I Breath de The Hollies e Creep de Radiohead.
Apesar de apresentar traços de filmes de terror, como um porão escuro e uma tensão constante aonde não sabemos o que pode acontecer em seguida, o grande foco da produção é o roteiro, principalmente seus diálogos e suas comparações ao discutir algo tão pessoal e ao mesmo tempo tão vasto dentro da nossa sociedade atual: Religião.
Sophie Tatcher e Chloe East em cena de “Herege”- Foto divulgada pelo Festival do Rio
Herege não pretende converter ninguém, respeitando as crenças, e não crenças de cada um, porém, não poupa esforços ao demonstrar contradições e fragilidades dentro de cada sistema religioso do mundo. Cristianismo, Judaísmo, Islamismo, Mitologia Grega, Hinduísmo, tudo é discutido no filme. Aos amantes de reflexões sobre a vida e a humanidade, este filme é um prato cheio, permitindo a audiência passar horas no bar entrando fundo neste buraco de coelho construído por Beck e Woods.
Apesar de toda a produção apresentar um ritmo lento, a primeira metade de Herege é ao extremo, dando prioridade em apresentar o contexto filosófico e reflexivo necessário para a audiência sentir a tensão do segundo ato da produção.
Neste momento Herege se torna um terror mais clássico, muito por conta da aparição de uma sacerdotisa, o “monstro” do porão, por assim dizer, porém, o verdadeiro horror do filme se encontra na frieza de Mr Reed, um homem sem um pingo de empatia e focado somente em demonstrar como as contradições da fé são aceitas pela humanidade como algo natural, ao invés de ser discutida por suas contradições.
Em seu último ato, Herege se torna um filme mais fantástico, na medida que Beck e Woods testam a fé do espectador, construindo atos e ações irreais, brincando com a consciência do espectador sobre o que aconteceu ao longo da produção.
Ao final, Herege pode não ser o filme de terror do ano, mas, cumpre o seu papel por meio de cenas tensas, traz o melhor papel de Hugh Grant em anos, talvez da carreira, e faz a audiência refletir sobre em que acredita, entregando boas atuações e um roteiro cirúrgico.
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