Dirigido por Peter Hastings, O Homem-Cão prova quão mutável a Dream Works consegue ser
Em 2001, Shrek (2001, Andrew Adamson, Vicky Jenson) se tornou a primeira animação a ganhar o Oscar de “Melhor Filme de Animação”. Produzido por um estúdio criado em 1994 por Steven Spielberg, David Geffen e Jeffrey Katzenberg, o filme abriu portas para muitos outros que viriam, tanto em quesito técnico por conta de sua animação em 3D que diferenciava a estética “perfeita” de filmes da Disney, quanto em questão de sátira e um humor auto-referencial que até os dias de hoje, a Disney ainda não usa eficientemente.
Ao longo de sua história, a DreamWorks lançou sucessos como Madagascar (2005, Eric Darnell, Tom McGrath), Kung Fu Panda (2008, Mark Osborne, John Stevenson), e o recente O Robô Selvagem (2024, Chris Sanders), porém, diferente da Disney, a DreamWorks é conhecida por ousar mais em seus filmes, não se baseando em somente uma fórmula na busca pelo entretenimento, e aproveitando o formato do filme para atuar como uma sátira do gênero, trazendo, por consequência, histórias mais interessantes e personagens moralmente mais complexos do que filmes produzidos pelo estúdio do rato.
Por bem ou por mal, a DreamWorks sempre correu mais riscos, com resultados variáveis, em filmes que vão de bizarros como Bee Movie (2007, Steve Hickner, Simon J. Smith), clássicos para todas as idades como Como Treinar o Seu Dragão (2011, Chris Sander, Dean Deblois) e filmes direcionados para um público infantil como O Homem-Cão (2025, Peter Hastings).
Peter Hastings não é estranho para a comédia visual usada em O Homem-Cão, responsável pelo criação de nada mais, nada menos, que a série clássica dos Animaniacs (1993-1997, Tom Ruegger), Hastings usa seu histórico com maestria, produzindo mais comentários metalínguisticos e visuais do que se consegue pegar em somente uma assistida, grande parte funcionando de modo eficaz.
Por conta disso, a comédia é um dos principais focos de O Homem-Cão, juntamente com uma animação descendente de filmes como Homem-Aranha no Aranhaverso (2018, Bob Persichetti, Peter Ramsey e Rodney Rothman) e filmes do próprio estúdio como Gato de Botas 2: O Último Pedido (Joel Crawford), em que a animação é muito mais fluida e se encaixa para o projeto desejado, diferente de um 3D padrão e chapado tão comum em filmes da Disney.
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Cena de O Homem-Cão- Divulgação Universal Pictures
Enquanto Gato de Botas 2: O Último Pedido usou esta estética para remeter aos livros de contos de fadas, O Homem-Cão a usou para remeter à estética marcante dos quadrinhos de Dav-Pilkey, inclusive em sua composição visual e cinematográfica, além do uso constante de marcas clássicas de quadrinhos como onomatopeias de diferentes estilos e uma história tão ridícula que não se consegue levar à sério.
Baseado na série em quadrinhos de Dav-Pilkey, O Homem-Cão conta a história de um policial e seu ajudante canino que são costurados em um só corpo após um acidente. Experiente em lutas marciais e combate ao crime, sua missão se baseia em capturar seu arqui-inimigo: o gato Petey, ao mesmo tempo, que lida com a solidão de uma nova vida como um híbrido canino.
Petey e Homem-Cão são espelhos um do outro, ambos criaturas solitárias, porém, tomaram caminhos contrários, um para a vilania e outro para o bem. Na verdade, vilania é um termo errôneo para definir Petey, ele está somente quebrado. A mensagem trazida por Hastings é semelhante, porém, menos explorada do que aquela trazida em Lego Batman: O Filme (2017, Chris McKay).
A diferença entre o filme de McKay e o filme de Hastings é o contato anterior que o público apresentava com seus personagens, a jornada de Batman e Coringa é semelhante à jornada de Homem-Cão e Petey, porém, a primeira dupla é extremamente conhecida e amada, a segunda pode ser amada por um público diminuto, mas, é bem menos conhecida, assim, dificultando a construção do drama na medida que esta relação herói e vilão deve ser explicada desde o começo.
O core dramático está presente durante toda a duração de O Homem-Cão, porém, não é devidamente explorada em nenhum momento, mesmo para um filme infantil, acredito que valeria a pena ter explorado melhor a diferença entre Petey ser realmente um vilão ou estar somente com a bússola moral quebrada, algo que é colocado em xeque quando aparece seu pai e visto principalmente em sua relação com Pequeno Petey.
O paralelo entre dois solitários que tomam caminhos distintos na vida, um que na vilania e outro que acaba um herói, caso tivesse sido melhor explorado, poderia levar o filme à novos patamares na medida que ensina às crianças uma lição que somente é tangenciada: “o mundo é cruel, mas, você não precisa ser também”. Apesar de utópica, é uma de tantas mensagens fundamentais que Pilkey transmite com seus marcantes personagens.
Com menos de uma hora e 30 de duração, ao final do dia podemos falar sem medo que o forte de O Homem-Cão não é a sua narrativa, afinal, a produção se encerra com kaijus gigantes destruindo a cidade, algo extremamente cansativo e clichê para filmes do século XXI. Seu forte é o entretenimento lunático. A quantidade enorme de piadas, desde gags visuais e de ação, referências à outros filmes e piadas um pouco mais adultas, marca de filmes da DreamWorks, e momentos dramáticos pontuais, como a cena em que Petey olha as estrelas com Pequeno Petey, permite um divertimento para todas as idades.
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