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  • CRÍTICA| Cem anos de Solidão é mágico do começo ao fim

    CRÍTICA| Cem anos de Solidão é mágico do começo ao fim

    Baseado no livro de Gabriel Garcia Marquez, Cem Anos de Solidão é uma das melhores e mais bem trabalhadas séries do serviço de streaming

    Gabriel Garcia Marquez escreveu Cem Anos de Solidão como o seu magnum opus, após trabalhar seus temas, personagens e o próprio vilarejo de Macondo em livros anteriores como Ninguém Escreve ao Coronel e Os Funerais de Mamãe Grande, Marquez lançou o livro em 1967, tornando-o uma referência até os dias de hoje.

    Ao retratar a ascensão e decadência da família Buendía, e sua extensão no povoado de Macondo, o livro contém de tudo: cenas bélissimas, guerra, amor, conflito, um erotismo saliente, personagens marcantes, discussões sobre religião, política e humanidade, sempre com muito humor e ironia para assim construir uma alegoria da América Latina.

    Cem Anos de Solidão é visto atualmente como um dos melhores livros daa literatura mundial, assim, não é de agora que diversos diretores tentam adapta-lo para o cinema como o italiano Francesco Rosi, o mexicano Anthony Quinn e até mesmo Francis Ford Coppola, porém, Garcia Marquez, além de autor, um professor de roteiro, construiu o livro de forma tão hermética que não seria possível adaptar tal obra em um filme de 2 horas, nem mesmo em um de 4, sem perder tudo o que o fez especial para inicio de conversa.

    Gabriel Garcia Marquez escreveu Cem Anos de Solidão inspirado nas histórias que sua mãe e avó contavam para ele em sua infância, nelas, sempre existiam acontecimentos fantásticos que eram vistos como naturais, assim, abrindo caminho para o estilo do realismo mágico que Cem Anos de Solidão representa tão bem: acontecimentos fantásticos são tratados como comuns e acontecimentos comuns são vistos como fantásticos.

    Gabriel Garcia Marquez, faleceu em 2014, o serviço de vídeo on demand ainda estava em seu início, a NETFLIX era um dos poucos streamings vigentes e mesmo assim, ainda estava no começo com produções autorais, tendo acabado de lançar Orange Is The New Black e House Of Cards, assim, Gabo não viu o monstro que estava nascendo, porém, apesar de não ter visto o seu magnum opus ser adaptado, o escritor viu adaptações de outras de suas obras.

    Cem Anos de Solidão

    Amor nos Tempos do Cólera teve uma adaptação em 2007 com grandes nomes como Javier Bardem, porém, foi um fracasso de público e crítica. No Brasil, Ruy Guerra adaptou em 1983 a história de Cândida Erendira, com um roteiro do próprio Marquez, e adaptou O Veneno da Madrugada em 2006, porém, estas e outras adaptações, jamais conseguiram capturar todas as nuances da literatura de Marquez.

    Com a permissão dos descendentes de Garcia Marquez, e seguindo algumas exigências específicas como a gravação ser realizada na Colômbia, ter um elenco colombiano, e a série ser completamente falada em espanhol, a NETFLIX assumiu as rédeas e decidiu adaptar Cem Anos de Solidão.

    Guiada por um narrador onisciente, Cem anos de Solidão é construída de modo fiel, seguindo beats e permitindo que os fãs do livro se maravilhem não somente com uma arte primorosa, principalmente em seus figurinos que representam tão perfeitamente a essência de cada personagem, cito como principal exemplo a dicotomia rosa de Amaranta com o azul de Rebeca; a construção física do cenário de Macondo que é completada com uma fotografia que se baseia em diversos planos sequências, cito dois como exemplo: o primeiro plano sequência em que conhecemos Macondo, e o plano sequência de Arcádio fugindo do exército enquanto o vilarejo é destruído.

    Cem Anos de Solidão é a série mais cara que a NETFLIX já realizou na América Latina. Para construir o realismo fantástico, foram usados diversas trucagens técnicas que permitiriam isso, ao mesmo tempo que conseguimos enxergar “aonde o dinheiro foi investido”, a série é extremamente pé no chão dentro de seu próprio universo fantástico, algo tão gritante no livro de Marquez, a cena final da morte de José Arcádio Buendia é uma obra de arte, porém, a série só se mostrou tão eficiente por meio de um elenco meticulosamente escalado.

    Eu poderia explorar cada um dos atores de Cem Anos de Solidão e explicar como foi uma escolha perfeita para o papel, porém, este texto ficaria tão longo quanto os pergaminhos de Melquíades, então basearei meu argumento em somente dois: Laura Sofía Grueso, Akima, como Rebeca Buendía e Claudio Cataño como o Coronel Aureliano Buendía.

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    Laura Sofía Grueso ‘Akima’ em cena de Cem Anos de Solidão– Divulgação Netflix

    Rebeca Buendía é uma das personagens mais queridas do livro e é interpretada com muita graça pela modelo Akima, em seu primeiro papel dentro do campo audiovisual. Ao enxergarmos a atriz no meio do canteiro, comendo terra para esconder sua dor, seu contato com a masturbação que fazia a casa inteira tremer, sua rivalidade com Amaranta, ou uma mordida de lábio ao enxergar pela primeira vez José Arcádio Buendia, a atriz consegue nos transportar para o seu universo particular de uma maneira que poucas conseguem.

    Apesar de vários destaques, a piece de resistance da primeira parte de Cem Anos de Solidão, tanto no livro quanto na série, é o mito, a lenda, o homem que é o Coronel Aureliano Buendía. Seu legado ultrapassa Cem Anos de Solidão a ponto de Gabriel Garcia Marquez citá-lo em diversos outros livros como ponto de referência, mais especificamente: Ninguém Escreve ao Coronel.

    Não existem palavras para descrever a potência de Claudio Cataño no papel, no livro, o personagem é enxergado como alguém que carrega a solidão em seus olhos cinzas, e isto é exatamente o que ocorre em sua atuação, durante todas as suas transformações ao longo da série, desde um homem esguio e solitário, sua relação com o anjo que foi Remédios Moscote e principalmente a sua transformação no mítico Coronel que persiste e influencia toda Macondo, ditando inclusive o começo do seu fim.

    Todo este cenário mágico e complexo foi cuidadosamente orquestrado e acompanhado por uma trilha sonora extremamente eficaz, na medida que a NETFLIX encerra com um gancho, como 90% de suas produções, somente nos resta esperar pela segunda parte desta odisseia latino americana, uma continuação que, na minha opinião como amante assíduo do livro, é onde se encontra os melhores momentos de Cem Anos de Solidão e onde o realismo mágico, cuidadosamente trabalhado nesta primeira partem, realmente é despertado.

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  • CRÍTICA| Sonic 3 encerra a trilogia com o seu melhor filme e abre caminhos para muito mais

    CRÍTICA| Sonic 3 encerra a trilogia com o seu melhor filme e abre caminhos para muito mais

    Dirigido novamente por Jeff Fowler, Sonic 3 amadurece seu universo em aventura divertida e emocionante

    O que eu acho mais divertido em toda a franquia Sonic, é o amor que os realizadores apresentam. O que deveria ser obviamente um flop por conta de uma escolha equivocada do design inicial de seu protagonista, acabou se tornando uma das poucas, senão a única, franquia de adaptação de videogame realmente bem sucedida, tanto em público quanto em crítica.

    Sonic 3 repete a fórmula que fez seus antecessores um sucesso, acrescentando novas camadas, principalmente por meio de uma facilidade que seus roteiristas apresentam: após dois filmes, e uma série derivada, o público já conhece estes personagens com a palma da mão, assim, eles podem ir direto para ação, o que é exatamente o que acontece desde a cena inicial, aprendendo com os erros de seu filme antecessor e não focando demais em personagens humanos que sequer lembramos os nomes.

    Sonic 3 trabalha uma fanfic extremamente bem estruturada, que já foi usado em seu filme antecessor com a inclusão de Knuckles, brilhantemente dublado por Idris Elba, e de Tails. Desde então o universo só aparenta crescer, e a Sega, juntamente com a Paramount, sabem muito bem a mina de ouro que têm nas mãos desde muito antes de um certo vídeo viralizar na internet, em que um menino demonstra seu amor pelo grande vilão do filme de agora: Shadow.

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    Shadow em Sonic 3- Divulgação Paramount Pictures

    A escolha de Shadow como o principal antagonista de Sonic 3 é antes de uma escolha narrativa, uma escolha completamente mercadológica, afinal, depois do ouriço azul, Shadow é um dos personagens mais conhecidos e amados de todo o lore de personagens. Um personagem difícil de adaptar dentro de um filme blockbuster PG-13, pois, mostrar a brutal morte de Maria de maneira eficiente é essencial para a construção de seu personagem, felizmente, o roteiro é construído de tal forma que após uma rápida montagem e uma linda frase sobre estrelas, já choramos com a morte da personagem.

    Do mesmo modo que nos dois primeiros filmes, dentro dos primeiros 10 minutos de Sonic 3, algum personagem expõem verbalmente de maneira bem clara qual é a mensagem do filme, neste caso específico, o filme gira em torno da dor não mudar quem nós somos, jamais tirando o bom que existe dentro de nós. Construindo um espelho claro entre Sonic e Shadow e gerando uma nova camada na medida que somos introduzidos à Gerald Robitink.

    Jim Carrey é um tesouro americano, percebemos em seu olhar o quanto o Doutor Eggman representa, e faz bem para ele, não a toa se tornando o único personagem de sua longeva carreira, que regressou 3 vezes, e desta vez, no melhor estilo Eddie Murphy, contracenando consigo mesmo e mostrando seu verdadeiro potencial como ator em mudanças sutis de gestos e comportamentos entre Ivo Robitinik e seu avô Gerald.

    Shadow, Gerald e Ivo Robitinik são os três principais vilões de Sonic 3. O primeiro é um ouriço que somente conheceu dor a vida toda; o segundo é um homem que deixou o seu rancor e ódio tomar conta, acreditando que um genocídio é a melhor maneira de ter paz; o terceiro é o antagonista que acompanhamos ao longo de dois filmes anteriores e presenciamos sua lenta, mas, satisfatória transformação, em um dos maiores vilões de videogame de todos os tempos.

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    Ivo Robotinik, Gerald Robotinik e Shadow em foto de divulgação de Sonic 3- Paramount Pictures

    Sonic e Robotinik são um espelho negativo um do outro, isto faz com que o embate entre ambos seja tão potente. Desde o primeiro filme, Sonic representa a força da amizade enquanto Robotinik representa os perigos da solidão, na medida que sua vida fez enxergar a amizade e a família como fraqueza, por conta disso, amando tão profundamente suas máquinas, ao inserirmos Gerald Robotinik no jogo, Sonic 3 ganha muito mais força, pois enaltece ainda mais a sua temática.

    O roteiro de Pat Casey constrói a temática da raiva, da angústia e da dor, presente em todos os seus personagens principais: Shadow, Ivo Robotinik, Gerald Robotinik e obviamente Sonic, os fazendo apresentar quatro jornadas distintas, mas, ao mesmo tempo muito significantes e complementares. Cada um deles está em algum espectro dentro da dor, alguns sem chance de retorno, outros ainda com esperança.

    Sonic 3 é o clássico filme pipoca, com profundidades diversas em certos momentos e cenas marcantes, porém, o que realmente o faz algo especial é a consciência que ele é justamente isso: uma forma de entretenimento para as massas.

    Eu assisti o filme em uma sala lotada, em seu dia de estreia, 25 de dezembro. Logo após a ceia, diversos pais e crianças com camisas do Sonic, bonecos, pelúcias, chapéus, combos superfaturados de marcas de cinema, todos sentaram em harmonia para assistir Sonic 3. A sala gritava em harmonia quando Shadow apareceu pela primeira vez, ficou em silêncio durante a morte de Maria, riu com uma performance artística de Jim Carrey, gritou em alguns eventos gloriosos como o retorno da esmeralda do caos e em uma cena pos-creditos que promete um quarto filme tão grandioso quanto.

    Esta é a força que Sonic 3 e a franquia como um todo apresenta. O roteiro é bem construído, a fotografia limpa, os efeitos visuais surpreendem em diversos momentos, os atores estão excelentes, e ele passa uma mensagem importantíssima não somente para as crianças, mas para adultos também. Ele nunca pretendeu ser um filme de Oscar, apesar de seu roteirista fazer campanha para uma indicação de Jim Carrey, e não pretende filosofar e sair de sua zona de conforto, ao contrário, usa a zona de conforto e cativa o público por meio de uma diversão leve e descompromissada.

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  • CRÍTICA| Babygirl entretém, mas,  não alcança o potencial máximo

    CRÍTICA| Babygirl entretém, mas, não alcança o potencial máximo

    Apesar de um bom filme, Babygirl poderia ter usufruído mais de seu erotismo

    Em 1999, Stanley Kubrick lançou aquele que se tornou seu último filme: De Olhos Bem Fechados. Com Tom Cruise e Nicole Kidman, o filme não teve medo de ousar ao contar a história de um homem de família que se envolve em uma seita sexual. Mais de 20 anos depois, também com Nicole Kidman, surge Babygirl, um filme que um usuário da plataforma Letterboxd enunciou como De Olhos Bem Fechados da geração Z.

    Para inicio de conversa, jamais se deve comparar qualquer filme com algo feito por Stanley Kubrick, nada jamais chegará naquele nível de excelência. Em segundo lugar, apesar de ter potencial e apresentar uma Nicole Kidman extremamente confortável em seu papel, Babygirl não alcança seu potencial como filme erótico, apesar de deixar bem claro os desejos de sua protagonista.

    Segundo Sigmund Freud, grande teórico da sexualidade, o desejo surge de pulsões internas como a sexualidade e a agressividade. Ao longo de Babygirl, acompanhamos Romy, Nicole Kidman em um dos melhores papéis de sua longeva carreira, uma C.E.O de grande corporação, casada com Jacob, Antonio Banderas, e com duas filhas. Sua vida muda ao conhecer Samuel, Harry Dickinson, um estagiário que liberta nela uma vontade reprimida de submissão dentro de relações sexuais.

    Discutindo questões como moralidade e a posição da mulher na sociedade, Babygirl é mais uma adição no catálogo de filmes da produtora A24 que somente este ano lançou outras 10 produções que incluem os excelentes Herege e Love Lies Bleeding, porém, dentro de uma produtora conhecida por filmes de destaque, Babygirl deveria ter proporcionado algo maior, tanto temática quanto esteticamente, para se sobressair, porém, acaba ficando na paralela e sendo somente um bom filme.

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    Nicole Kidman em Babygirl- Divulgação Diamond/A24

    Em questão de estética, a produção apresenta uma direção de arte minimalista, com cenários belos dentro de um universo corporativo, uma trilha sonora marcada por músicas pop e uma fotografia exemplar. O clima natalino permite muitos jogos de luzes, e uma mudança na paleta de cores na medida que Romy se permite desfrutar da própria sexualidade e presencia novas emoções que nunca teve em 19 anos de relacionamento com seu marido. Toda esta construção narrativa, ganha muita força com a presença de Samuel.

    Em O Último Tango em Paris (Bernardo Bertolucci, 1972), os personagens de Marlom Brando e Maria Schneider, decidem se isolar em um apartamento, sem saber nada de suas vidas anteriores, para assim conseguir desfrutar do erotismo de uma maneira única. O roteiro e direção de Halina Reijn segue esta ideia do mistério, construindo Samuel mais como uma figura emblemática, do que como um personagem tridimensional por si. Quando não conhecemos nada da história de um personagem, ele corre o risco de perder a força e se tornar esquecível, porém, no caso de Harry Dickinson, isto somente engrandece seu personagem e por consequência toda a narrativa de Babygirl.

    Em questão de temática, a produção pode ser considerado um coming of age tardio, na medida que Romy se redescobre e cresce com suas experiências. Auxiliado por excelentes atuações, somos apresentados a este universo de dominação, um tabu ainda em certos meios sociais. Os momentos íntimos entre Romy e Samuel ocasionam os pontos altos da produção.

    Ao considerarmos que a geração Z quer menos cenas de sexo em produções cinematográficas, Babygirl ousa muito em momentos pontuais, porém se segura em outros que poderiam ter tido maior ousadia em pró de um maior impacto erótico e no filme como um todo, como a questão da moralidade de Romy, algo presente, principalmente por conta da sua relação com sua assistente Esme, porém, nunca explorada em sua totalidade além de uma discussão sobre o exemplo que ela deve passar por ser uma mulher C.E.O.

    A produção é boa, porém, fica na paralela de diversos temas sociais, o universo corporativo e o seu machismo sobressalente, o papel da mulher dentro e fora da família, o desgaste das relações matrimoniais, a repressão e o desejo sexual, porém, por bem ou por mal, não se aprofunda especificamente em nenhuma delas, construindo um filme de personagem e focando na jornada de libertação e auto-descoberta de Romy, que seguirá muito depois dos créditos se encerrarem.

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    Pôster Oficial de Babygirl– Divulgação A24

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  • CRÍTICA | Superman e Lois traz um final apoteótico para o herói em sua 4º Temporada

    CRÍTICA | Superman e Lois traz um final apoteótico para o herói em sua 4º Temporada

    Superman e Lois aumenta o escopo para como se adaptar o escoteiro da DC Comics, que vai receber uma nova visão em 2025 e terá um páreo a alcançar.

    Após uma batalha crucial com o monstro criado pelo Lex Luthor (Michael Cudlitz), Superman (Tyler Hoechlin) está morto e tanto sua esposa quanto seus filhos precisam lidar com as ameaças a fora que não foram derrotadas e não planejam parar de causar o caos pela Terra.

    Uma informação importante de se dar é que a produção da quarta temporada da série foi completamente afetada graças ao cancelamento da produção e o fato de que não só a produtora CW está chegando ao fim, mas o personagem Superman está retornando aos cinemas com outro ator no papel e aquele deve ser a única versão a ser encontrada pelo novo universo da DC que será estabelecido na indústria audiovisual.

    Sendo assim, com o corte no orçamento, no qual cada temporada custava 75 milhões pelos seus 15 episódios, diversos atores regulares das três temporadas antecessoras não puderam retornar para todos os episódios, tal qual o dinheiro investido em efeitos visuais precisou ter um equilíbrio para os últimos 10 episódios que o seriado reservaria tendo apenas a família do Superman e seu inimigo como protagonistas do enredo ao todo. E o que se pode dizer é que um milagre foi feito.

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    Superman e Lois | Max

    Em qualidade, dá pra dizer que a temporada manteve um nível favorável para as engrenagens que tinha, cada episódio traz um núcleo dos personagens coadjuvantes, que ganham um desenvolvimento e uma conclusão formidável para o que havia sido preparado na temporada anterior, sem enrolação e seguindo de modo direto para que de alguma forma ainda case com a narrativa principal envolvendo derrotar Lex Luthor.

    Contudo, nem tudo são flores, o roteiro de Superman e Lois muitas vezes demonstra correria com assuntos que poderiam ser melhor aprofundados como uma recém descoberta de poderes ou demonstra perda de tempo com um casamento que não apresenta certo propósito para a trama como um todo, onde fica visível que outros assuntos poderiam ser trabalhados no lugar como um trauma pós uma morte chocante.

    Isso sem contar deslizes que acabam acontecendo por falta de atenção ou conveniências que precisavam acontecer, visto que em certo momento da temporada um ser enorme some por alguns episódios, os personagens não sabem onde a criatura está, quando ela se encontra num subsolo que qualquer um com poderes kryptonianos poderia ter localizado. Tal qual, erros estúpidos que personagens cometem para trazer vantagem ao inimigo, seja quebrar propriedade pública ao vivo pra televisão ou decidir ensinar algo aos filhos que poderia ter sido realizado no começo.

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    Superman e Lois | Max

    Dito isso, a temporada se sobressai pelas decisões divergentes que toma com o rumo do Superman. Boa parte do que se vê aqui não foi visto em nenhuma outra mídia, principalmente se tratando do final, e o modo como é conduzido, é com uma delicadeza e profundidade, que não só humaniza o personagem como consegue honrar sua essência, naquilo que foi estabelecido no seriado desde o princípio até aquilo que os leitores mais assíduos entendem do herói.

    Ainda que o último episódio seja emocionante, o destaque fica pro capítulo 7 intitulado “A Regular Guy”, não só pela coragem em seu final e no que isso vai proporcionar aos personagens no futuro, mas por trazer um personagem clássico dos quadrinhos de um jeito que encaixe de modo ideal, explicando sua ausência nas outras temporadas e trazendo uma noção maior do sacrifício que o Clark Kent passa todos os dias e o público deixa de ver só por ser quem é.

    Mesmo com alguns episódios apresentando a forte ausência de alguns integrantes do elenco, não fazendo sentido não estarem agindo para com tal momento ou quando aparecem nem falando muito sobre, o tempo curto que a temporada tem para resolver todos os seus assuntos deixa ela rápida e direta num geral, relembrando aos fãs do porquê se sobressai entre as obras de super-heróis e mantendo a qualidade na trilha sonora comovente, no encaixe da trama de Lois com a do Superman e no claro amadurecimento que cada personagem passou para estar da maneira que se encontra.

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    A quarta temporada de Superman e Lois tem suas decisões questionáveis, mas se tratando de uma produção que planejava finalizar em uma sétima temporada, correndo para abordar certas tramas que deveriam ficar pro futuro, o saldo é realmente positivo. Mostrando que aquilo que a diferencia não se relaciona às cenas de ação ou ao mundo realista imposto, mas em compreender a inspiração que um homem pode transparecer e como a sua família, tão fácil de encontrar no dia a dia, se mostra fundamental para melhorar a pessoa que busca ser.

    Aqui, tanto o intérprete de Clark quanto a intérprete de Lois Lane (Elizabeth Tulloch) deixam suas marcas como uma das, se não “as”, melhores versões que foram adaptadas dos quadrinhos. Todas as nuances tendo sido trabalhadas, desde as características mais famosas até aquelas pouco abordadas, pelo menos do jeito certo. A química faz parecer que na vida real são um casal e a sintonia em tela leva o espectador a compreender o motivo de serem um dos casais mais amados dos quadrinhos de heróis, e não por repetir o que foi feito, mas por melhorar. Proporcionando uma despedida que mesmo sendo triste, ainda apresenta beleza por ter nos dado a chance de acompanhar o máximo possível com tamanha intensidade.

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  • CRÍTICA| Amor da Minha Vida mira no real e acerta a comédia romântica

    CRÍTICA| Amor da Minha Vida mira no real e acerta a comédia romântica

    Estrelada por Bruna Marquezine, Amor da Minha Vida surpreende em sua construção

    Este sou eu agora. Escrevendo a crítica de uma série que não esperava muita coisa. Apesar de apreciar comédias românticas, e ter adorado a série de Todas As Mulheres do Mundo (2020, Jorge Furtado), Amor da Minha Vida não me prendeu nem pelos trailers e nem pelos diálogos, que inicialmente aparentavam extremamente falsos e irreais.

    Logo na primeira cena, eu me vi atraído por uma Bruna Marquezine extremamente confortável no papel de Bia, não a toa ela também produziu, auxiliou no roteiro e foi co-diretora em alguns episódios da produção. Ao longo da série acompanhamos Bia, Bruna Marquezine, e sua relação platônica com Victor, Sérgio Malheiros, em um papel bem menos complexo do que Bia. O elenco de coadjuvantes inclui, João Guilherme, atual namorado de Marquezine e Sophia Abrahão, atual namorada de Malheiros, ou seja, de alguma forma o projeto acaba sendo de família.

    A fotografia e arte são exemplares, principalmente em momentos mais oníricos como o final do episódio 5, aonde a edição da série realmente se supera, ao demonstrar uma espécie de “imaginação/ realidade” que deixa a cena de (500 dias) com Ela (2009, Mark Webb) no chinelo. A direção é bem simplista, seguindo todos os traços clássicos de comédia romântica e embelezando seus personagens de uma maneira que somente a câmera de cinema consegue. O amor envolvido na construção da série é nítido, porém, o maior problema que permeia durante toda a produção de Amor da Minha Vida é o roteiro.

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    Comentando incialmente os diálogos, uma crítica contundente à produção, é o uso constante de monólogos internos, em sua grande maioria iniciados com “Este sou eu agora”. Além disto, é construído uma estrutura de tão nível filosófico, que os personagens constantemente aparentam narrar um livro, ou declamar uma poesia, ao invés de falar como pessoas normais. O que pode irritar o espectador que não compreender a principal intenção de Amor da Minha Vida, algo presente também na produção de Todas as Mulheres do Mundo.

    O objetivo da série não é ser realista, e sim construir algo belo e lúdico, que apresentam traços de realidade, por conta disso, construindo algo teatral e com diálogos dramáticos demais em certos momentos. Assim, apesar de os personagens não apresentarem reais em seus modos de falar, e até mesmo de agir, todos apresentam um fundo real, melhor ou pior construído, com um destaque, obviamente, para Bia.

    Amor da Minha Vida mostra as relações fluidas da atualidade com uma normalidade pouco vista em séries atuais. Não monogamia, trisais, relacionamentos casuais, relacionamentos monogâmicos, traições, garotas de programa, tudo isto aparece de uma forma ou outra, demonstrando o enorme leque que os relacionamentos atuais se encontram. Esta bagunça atua como gasolina para o fogo que a série tenta aquecer durante toda a sua duração, porém, apesar de tentar, ainda mais com uma classificação etária de 18 anos, não consegue alcançar, focando no belo, no seguro e no simples, o que não é um problema inicialmente, até começar a ser.

    Amor da Minha Vida apresenta 10 episódios e diferentes locações e acontecimentos, focando principalmente no Rio de Janeiro, porém, também incluindo Brasília e uma quantidade muito grande de bares e casas para festas. Ao longo desta jornada, vemos os altos e baixos da amizade de Bia e Victor, e vemos o inevitável, que o público consegue prever no primeiro episódio, eles se amam, mas são complicados demais para ficarem juntos.

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    Fernanda Paes e Bruna Marquezine em cena de Amor da Minha Vida- Divulgação pela Star +

    Esta enrolação de ambos continua durante toda a produção, na medida que saem com outras pessoas como Fernanda Paes, que contracena uma calorosa cena de sexo com Marquezine que viralizou na internet, Sophia Abrãao, entre outras, porém, nenhum dos outros ficantes acaba tendo camadas, sendo cascas vazias que auxiliam na construção de Bia e Victor. Ao final, ambos percebem que sempre foram feitos um para o outro, se separam novamente, para se unirem, traírem seus respectivos namorados/namoradas, até chegar ao final que, para a surpresa de ninguém, ambos ficam juntos de vez, após ficarem bravos por passarem exatamente o que eles fizeram os outros sofrerem.

    Bia em diversos momentos é imatura e egocêntrica, Victor é uma criança em forma de adulto funcional. Os secundários não merecem tanto destaque assim, porém, apesar de todos estes problemas estruturais, Amor da Minha Vida merece muito valor por conta de sua construção, não a toa se tornou a série nacional Disney + de maior sucesso de 2024, apresentando um gancho e potencial para uma segunda temporada que provavelmente ocorrerá.

    Levando em conta o que se propõe, a série alcança seu objetivo: construir um conforto para românticos e casais, trazendo uma estética bela e bem construída, com boas atuações de seus protagonistas e algumas reflexões sobre a vida, o universo e suas relações complicadas, o que já é mais do que muitas produções atuais entregam.

    Amor da Minha Vida com certeza será um pulo em sua carreira, ele está brilhante e a série foi construída para ela brilhar. Como um todo, a produção tenta trazer realidade e quebrar esteriótipos de comédias românticas, porém, ao final, acerta bem no alvo daquilo que tentou fugir, o que pode ser bom ou ruim dependendo do espectador, para mim, foi uma grata surpresa.

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  • CRÍTICA | O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim é um morno retorno ao universo de Tolkien

    CRÍTICA | O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim é um morno retorno ao universo de Tolkien

    Com uma nova protagonista e diversos cenários conhecidos, Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim se utiliza de uma nova estética para manter o fã cativo

    Em 2003, Peter Jackson lançou Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei, finalizando uma das maiores trilogias de fantasia da história e ganhando 11 Oscars no processo. Após mais de 20 anos, uma tentativa de uma nova trilogia com O Hobbit, uma série da Amazon que divide público e crítica, somos apresentados a um novo modelo de transmídia, por meio de Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim em uma animação 2D com um estilo fluido que somente é permitido por meio da estética anime.

    Produzido por Peter Jackson e dirigido por Kenji Kamiyama, o filme conta a história de Héra, filha do rei de Rohan: Helm Mão de Martelo, que deve liderar os Rohirrim, e lidar com a inimizade de seu amigo de infância, após o pai ocasionar um conflito ao defender sua honra.

    A produção apresenta diversas relações com a trilogia original de Jackson, como a aparição de locais como Isengard, Ronan e a citação de Gondor, além da maior ligação com a trilogia original: o fato de Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim ser dublada por Éown, uma das poucas mulheres, e uma das mais importantes de toda a jornada do anel escrita por Tolkien.

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    O Mûmakil recebe um destaque assustador no filme- Divulgação por Warner Bros Pictures

    A escolha de Éown como narradora é proposital, na medida que Héra é uma protagonista somente citada em apêndices do material original de Tolkien, nem mesmo apresentando um nome por si, um fato inclusive citado no filme, a produção apresenta liberdades para a construção de sua história, assim, Héra se torna uma líder determinada, teimosa e guerreira, porém, acaba caindo em um mito atual da strong female character.

    A strong female character é um arquétipo muito usado na cinematografia atual, sendo o oposto da donzela em perigo, visto em tantas produções ao longo do século XX, porém, apesar de existirem personagens femininas louváveis que pertencem à este arquétipo, como Elen Ripley na franquia Alien, diversas outras personagens caem no espectro de pouco desenvolvimento e acaba sendo forte, somente por ser mulher, quando na verdade deveria ser uma mulher que coincidentemente é forte, trazendo uma maior profundidade à personagem.

    O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim, apresenta diversos personagens interessantes, principalmente Helm Mão de Martelo, um dos personagens mais fortes e determinados, apresentados em todo o universo Tolkien, e que apresentaria muito mais potencial para carregar um filme do que Héra.

    O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim apresenta diversos pontos positivos, todos eles relacionados à estética escolhida para a produção. O anime permite uma maior fluidez e um maior nível de detalhismo que somente a animação consegue trazer, um olhar transmite muitos mais sentimento do que uma atuação jamais poderia trazer, até mesmo de animais como águias e os Mumakil, além disso, o filme não apresenta medo de mostrar a violência de toda a Guerra dos Rohirrim por si, ocorrendo mortes tão chocantes quanto os filmes de Jackson.

    Senhor dos Anéis: Guerra dos Rohrim

    Cena de Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim- Divulgado pela Warner Bros Pictures.

    Apesar de esteticamente ser uma obra exemplar, em questão estrutural de narrativa o filme peca, principalmente na construção de sua protagonista, que apresenta pouco aprofundamento além do fato de ser guerreira, não querer casar, amar seu pai e ser ruiva. O roteiro apresenta alguns furos e problemas de ritmo, como um discurso otimista de Helm, em plena batalha, vemos homens avançando para atacá-lo, porém, coincidentemente eles somente o alcançam quando acaba de dar um longo discurso.

    Com duas horas e 14 de duração, a produção se estende um pouco mais do que deveria, nem mesmo as batalhas mais épicas conseguem salvar o filme de se arrastar. Acompanhamos a iminência da batalha, o conflito entre Héra e Wulf, a mitologia criada em cima da imagem de Helm, que poderia ser explorada muito mais, e diversas frases de efeito que tentam recriar o a potência da frase de Éown na batalha final de O Retorno Do Rei.

    Na medida que bebe do passado, O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim perde forças por si só, apresentando momentos obviamente de fan service como a aparição de Saruman para falar uma frase e somente uma menção à Gandalf.

    Apesar de ser um bom retorno à Terra Média, sendo considerado um ensaio para futuras produções como A Caçada por Gollum. Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim toma escolhas duvidosas em sua construção, porém, para uma reintrodução cinematográfica à Terra Média, acaba cumprindo o seu papel de teste, atraindo os fãs de volta.

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  • CRÍTICA| Wicked pega algo bom e evolui a um nível glorioso

    CRÍTICA| Wicked pega algo bom e evolui a um nível glorioso

    Unindo um dos melhores musicais da Broadway, e o melhor que a sétima arte consegue proporcionar, Wicked é gigante na medida certa.

    Baseado no musical da Broadway, que é baseado no livro homônimo de 1995, escrito por Gregory Maguire, que é baseado no filme O Mágico de Oz, que por sua vez é baseado no livro homônimo de L. Frank Baum. Wicked se tornou um sucesso milionário ao longo dos anos, estando a mais de 20 anos em cartaz na Broadway, porém, uma produção cinematográfica parecia longe de acontecer, apesar de seu contexto ser extremamente cinematográfico.

    Jon M. Chu ficou encabeçado pela direção, e cada plano do filme, demonstra o amor que o cineasta apresenta pela produção e por toda a história, a ponto de ter cultivado 9 milhões de tulipas para construir Munchkinland, ao invés de simplesmente ter optado pelo CGI, algo constante no filme, porém, com um grau de personalidade perdido após tantos filmes de super heróis.

    Com o título oficial de Wicked: A História Não Contada das Bruxas de Oz, a produção conta a amizade e iminente separação de Glinda, a bruxa boa do Sul, e Elphaba, a bruxa má do Oeste, antes dos eventos que levaram à derrota da última pelas mãos de Dorothy.

    Um acontecimento ocorrido na sessão, define as vantagens de Wicked com maestria. Após a performance da música The Wizard And I, a plateia inteira aplaudiu e gritou, porém, um homem gritou no fundo da sala que ali não era um teatro. Apesar de apresentarmos esta consciência, Jon M. Chu construiu sua adaptação como uma experiência que não ignora as qualidades do icônico musical, mas sim as amplia, tornando algo glorioso e especial para fãs.

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    Ariana Grande em cena de Wicked- Divulgação Universal Pictures

    Os melhores truques usados por Jon M. Chu são: direção de fotografia, design de produção e principalmente elenco.

    A direção e a direção de fotografia se somam, por meio de diversos planos sequências e detalhes, o filme proporciona uma experiência que nenhuma performance teatral, por mais grandiosa que seja, jamais conseguiria proporcionar. No teatro, estamos distantes dos personagens, o cinema permite uma maior aproximação. Um pé empinado na performance de Popular, um abraço que a câmera está mais próxima do que nunca deste amor fraternal, um plano sequência que acompanha Defying Gravity, entre outros momentos que nos tiram o fôlego. Por meio de um universo fantástico e meticulosamente cuidado, Wicked consegue cativar até mesmo aqueles que não gostam de musical.

    O design de produção é estrondoso, O Mágico de Oz é um dos filmes mais importantes da história do cinema, e isto é relembrado a cada plano idealizado por Chu e companhia. A criação estética da produção é assustadora, jogos de luzes, figurinos maravilhosos, construções idealizadas somente para o filme como um trem de 16 toneladas que realmente anda, efeitos práticos em momentos essenciais, e efeitos digitais que se somam dentro deste universo fantástico e lúdico que é Oz.

    Além de tudo isto, o principal ponto a se considerar em Wicked, e sua maior força como um todo, é o elenco estelar escolhido a dedo: Ariana Grande é fantástica como Glinda, roubando a cena toda vez que aparece, trazendo uma Glinda perfeita como contraponto à Cynthia Erivo, o verdadeiro brilho da produção.

    Idina Menzel eternizou Elphaba na primeira versão teatral de Wicked, porém, após Cynthia Erivo, não me surpreenderia se futuras interpretações da personagem, sejam feitas por mais atrizes negras. Cada música, cada tom, cada performance brilhante, consegue levar a audiência ao chão e nos faz refletir sobre o quanto a público e a audiência desvaloriza certas atrizes.

    Cynthia Erivo e Ariana Grande em cena de Wicked

    Cynthia Erivo e Ariana Grande em cena de Wicked- Divulgação Universal Pictures

    Todo o crédito à Ariana Grande, sua performance está excelente e seu estrelato como uma das maiores cantoras pop da atualidade, com certeza trará milhões de pessoas ao cinema, somente por ela, porém, é Cynthia Erivo que realmente domina o filme todo, apesar do duplo protagonismo de ambas. Levando em conta que ambas cantaram ao vivo, é algo assustador o que se construiu.

    Como um todo, Wicked é espetacular, agradando gregos e troianos, os fãs de musicais e somente os apreciadores de bom cinema. Por 2 horas e 40, somos maravilhados por beleza atrás de beleza, até terminar na joia da coroa que é a performance de Defying Gravity, prometendo grandes coisas para a sequência programada para 2025.

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  • CRÍTICA | Arcane traz uma jornada inesperada com uma animação superior para sua 2º Temporada

    CRÍTICA | Arcane traz uma jornada inesperada com uma animação superior para sua 2º Temporada

    A última temporada da primeira adaptação do universo League of Legends, realizada pela Netflix, encontra o equilíbrio ideal de fazer algo diferente, inesperado e cheio de coração.

    Depois de anos esperando o retorno, de uma das maiores surpresas já entregues pela plataforma da Netflix, para compreender o que houve após a personagem Jinx lançar um ataque contra a elite de Piltover que organizava um acordo de paz com o lado de Zaun, já que personagens importantes poderiam ter morrido e uma nova guerra poderia se instaurar, seria difícil segurar a ansiedade e empolgação, ainda mais com a qualidade que nos foi entregue a primeira temporada. Então, para quem aguardava algo do mesmo nível ou até mais, dificilmente se decepcionou.

    Uma coisa que surpreende de cara ao iniciar a 2º Temporada de Arcane é ver o contraste nas animações, remetendo ao que Homem Aranha: Através do Aranhaverso fez recentemente, brincando com estilos de animação, com a contagem de frames por segundo e evoluindo o que já havia feito anteriormente, esclarecendo a demora para essa nova temporada chegar, tal como fazendo valer a pena essa espera. Indo de uma tinta guache para uma forte conversão com o estilo 2D, remetendo a algo mais desenhado e rabiscado.

    A complexidade em curtas cenas deve ser reconhecida também, já que durante alguns movimentos, mesmo que tudo seja desenhado ou feito no computador, a câmera parece se prender a um objeto, trazendo uma sequência quase que em primeiro plano. E indo além, ao brincar com inúmeras realidades, em fundos desfocados ou planos rápidos, é possível ver indicadores do que está diferente, do que vem de uma memória antiga ou universo perdido.

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    Arcane (2º Temporada) | Netflix

    Entretanto, as qualidades não param pelo visual e a narrativa progride de modo fascinante, o inicio da temporada acarreta em personagens que até então não haviam interagido, se conhecerem, e outros com problemas pendentes, a se resolverem. A promessa do que poderia ficar para o final da temporada, ganha um clímax já no terceiro episódio, e as surpresas não param por aí, já que cada trama percorre pra um caminho divergente do outro e ainda que possam soar distantes, apenas vão se entrelaçando mais para um afetar o outro, progredindo para um final arrebatador.

    O grande diferencial de Arcane, contudo, não vem na entrega das tramas e sim na abordagem reflexiva que cada personagem proporciona com seus anseios e suas resoluções para com os problemas, indo de comprar a ideia pelo controle de um povo por uma perspectiva ditatorial para a fé cega que pessoas doentes ou frágeis tendem a demonstrar para com aqueles que aparentam trazer a verdadeira cura, quando essa farsa vem de um poder desconhecido que não deveria ter sido encontrado.

    Além disso, o tratamento para com a complexidade dos personagens desenvolvidos brilha ao tirar a ideia de que uma é vilã por ter tomado péssimas decisões ou que o mais santo não poderia esconder um monstro dentro de si, proporcionando ao espectador sentimentos contrários diversas vezes, porque entre o certo e o errado, existem apenas pessoas afetadas pela jornada, pelo passado (ou pelo futuro), que sentem a necessidade de responder de acordo com o que as prepararam para aguentar e tal preparo não foi suficiente.

    Arcane (2º Temporada) | Netflix

    Arcane (2º Temporada) | Netflix

    Dessa forma, cada atitude repercute e impacta na vida de outro, podendo levar a repensar as ideias, reconhecer os erros, ou abraçar ainda mais o possível destino que imagina ter pra si. Com isso, ainda que os 40 minutos de duração por capítulo deem conta de contar uma história fluída, sem soar apressada ou enrolada, não deixando cada trama ficar perdida na festa. Os personagens acabam sendo tão ricos, passando por situações tão interessantes e até complexas, que seria merecido receberem uma temporada para protagonizar ou um episódio completo para si, como de certa forma ocorre no sétimo ”Fingir que é a primeira vez”.

    Ao final, portanto, não deixa a desejar, entregando muita ação e filosofia ao mesmo tempo, relembrando o inicio da série, as relações que realmente importam, ao mesmo tempo que cada pequeno detalhe plantado durante a jornada ganha fruto. Ainda que alguns ocorridos possam soar apressados, na minha visão, eles veem pelo bem da urgência que o final pede. E a falta de mais diálogos sobre o fim dos que sobreviveram ganha preenchimento com o pouco mesmo. Se quiser algo mastigado, tem muitas outras obras que farão o serviço desnecessário.

    Vale destacar que além da animação excelente e, como devo ter transparecido durante o texto, a ótima montagem guiando tantas tramas em conjunto sem deixar perdido aquele que assiste, há um exímio trabalho por parte da trilha sonora presente em meio aos combates que, mesmo ficando mais perceptível um valor adicional por parte da produção para trazer mais músicas ao invés da primeira temporada que veio em momentos pontuais, consegue intercalar pontualmente com cada cena, causando a comoção pedida pelo roteiro e de forma alguma, sendo encaixada forçadamente.

    O terceiro capítulo ”Finalmente acertou o nome” representa de forma espetacular o que estou elogiando, porque não é qualquer obra que consegue casar uma cena de ação com uma cena de descoberta totalmente fora da casinha, oferecendo uma bagunça visual que nunca se torna incompreensível, onde a música usada consegue tanto funcionar de um jeito empolgante para o combate visto quanto de modo lúdico, como se tivesse fazendo uma descoberta que mudaria o mundo e a forma de pensar sobre, que é exatamente o que ocorre em cena.

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    Arcane (2º Temporada) | Netflix

    Arcane entrega um daqueles finais satisfatórios, onde a produção prova que sabia a história que queria contar, para onde planejava levar e em que momento sabia que devia parar. Mesmo com a divisão de arcos proporcionado pela entrega semanal de episódios, o ritmo nunca se perde e consegue muito bem equilibrar os momentos de paz com pura loucura. A estética evolui em muito e fácil pode se estabelecer como uma das mais lindas que vai encontrar, onde cada frame pode servir de plano de fundo pra tela do computador.

    Mesmo que a série seja baseada em jogos e fique claro que os personagens estão evoluindo para se tornarem algo familiar para quem entende, isso em nada afeta a experiência daqueles que desconhecem, mostrando a sabedoria de conseguir mexer com algo que tem sua base de fãs e agradar tanto ela quanto aqueles que podem se interessar a partir do que assistiu. Demonstrando ser uma obra completa!

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  • CRÍTICA | Em Gladiador II, Ridley Scott retorna à arena com ambição e crítica ao Poder

    CRÍTICA | Em Gladiador II, Ridley Scott retorna à arena com ambição e crítica ao Poder

    Mesmo carregado de sentimentalismo e algumas conveniências narrativas, Gladiador II ousa expandir o universo da Roma Antiga, apresentando novos protagonistas divididos entre lealdade e rebeldia.

    Desde que lançou “Gladiador” (2000), há mais de vinte anos, Ridley Scott (“Blade Runner”) manteve um ritmo de produção impressionante, chegando a lançar dois filmes por ano, até mesmo aos 86 anos. Ainda que sua filmografia tenha se expandido consideravelmente desde então, “Gladiador” segue sendo uma de suas obras mais adoradas. Após anos de pedidos por uma continuação, Scott finalmente traz “Gladiador II” aos cinemas, retomando a história com seu toque característico de crítica afiada às grandes corporações — agora adaptada ao contexto do Império Romano.

    Na nova trama, Lucius (Paul Mescal), ao ver seu lar ameaçado pelos tiranos que governam Roma, é forçado a entrar no Coliseu. Ele precisará revisitar seu passado em busca de forças para restaurar a glória de Roma e devolver sua dignidade ao povo.

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    Gladiador II | Paramount Pictures


    Diferentemente de retomar a jornada de Maximus (Russell Crowe), Scott adota uma abordagem atualizada, mais próxima de seu estilo recente, ao dividir o espírito do protagonista original entre Lucius e Acacius (Pedro Pascal).

    Enquanto Lucius carrega o ressentimento por ter sido injustiçado pelo Império, influenciado também por sua relação com Lucilla (Connie Nielsen), irmã de Commodus, Acacius, um general que vive no coração do poder, sente o peso de servir a uma sociedade obcecada pela conquista, mas que ignora seu próprio povo. Esses personagens confrontam o Império de perspectivas diferentes, criando um embate entre lealdade e insubmissão, atualizando e aprofundando as questões do filme original.

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    Gladiador II | Paramount Pictures


    Entre os destaques do elenco está Denzel Washington (“Dia de Treinamento”), que brilha no papel de Macrinus, um vilão astuto que manipula o cenário político com maestria, entregando uma atuação magnética e implacável.

    O longa-metragem também resgata diversas rimas visuais e sonoras que marcaram o primeiro “Gladiador”, buscando, assim, reforçar a nostalgia do público que acompanhou o sucesso anterior. No entanto, essas referências são apresentadas com efeitos variados e nem sempre sutis, o que pode criar uma sensação de familiaridade, mas também de repetição.

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    Gladiador II | Paramount Pictures

    Embora Ridley Scott se destaque no aspecto técnico com a criação de cenários grandiosos, batalhas épicas e cenas meticulosamente elaboradas, sua direção, em alguns momentos, exibe uma certa falta de controle. Esse descontrole se reflete na utilização de conveniências narrativas que parecem forçadas e no excesso de sentimentalismo, principalmente nas passagens relacionadas aos laços familiares de Lucius, que acabam ganhando um peso dramático exagerado. Ainda que o diretor amplie as discussões sobre poder, ambições e ideais, algumas tramas que foram encerradas de forma clara no primeiro filme retornam de maneira redundante, o que prejudica a sensação de urgência e novidade em determinados momentos da história.

    Além disso, o ritmo da narrativa, em certos trechos, se torna um tanto arrastado, prejudicando o fluxo geral da trama. O exagero no sentimentalismo e a insistência constante em explorar temas familiares fazem com que algumas das decisões de Lucius se tornem previsíveis e, por consequência, enfraqueçam a complexidade de suas escolhas. O longa, em diversos momentos, parece se prender excessivamente a essas questões, limitando o desenvolvimento de outros aspectos da história e diminuindo o impacto de certas reviravoltas e personagens.

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    Gladiador II | Paramount Pictures


    Ao final, entre acertos e erros, “Gladiador II” apresenta um saldo positivo. Apesar das falhas apontadas, a nova aventura entrega um espetáculo visual e oferece uma crítica provocadora ao sistema de poder, contando com um elenco talentoso que, ao lado de Scott, dá continuidade ao legado do primeiro longa. Embora perca fôlego em algumas partes, o filme mantém sua crítica incisiva ao poder e aos impérios, entregando uma obra ambiciosa que desafia convenções históricas.

    “Gladiador II”, portanto é pop, desafiador e frenético; para Scott, que já se consagrou, alcançar a eternidade deixou de ser prioridade — agora, ele aproveita a liberdade de sua própria arena.

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  • CRÍTICA | Pinguim se Torna Aposta Certeira da DC e Peça Fundamental para o Futuro do universo de Matt Reeves

    CRÍTICA | Pinguim se Torna Aposta Certeira da DC e Peça Fundamental para o Futuro do universo de Matt Reeves

    Com uma narrativa intensa e personagens complexos, Pinguim revela a essência perturbadora de Gotham e promete moldar e revirar o futuro do universo de ‘The Batman’.

    A série do Pinguim, nesse contexto de um pós -“The Batman”, traz uma profundidade muito interessante para um personagem que, apesar de carismático, sempre foi uma figura perturbadora e, até certo ponto, incompreendida. A atuação é, sem dúvida, o ponto mais alto da trama, com o ator (Colin Farrell) encarnando o Pinguim de uma forma que nos faz questionar constantemente nossa própria visão sobre o que é “bem” e “mal”. Essa habilidade de fazer o público simpatizar com um psicopata e depois, no mesmo episódio, lembrá-lo de sua frieza é um jogo arriscado, mas bem executado. A série tem coragem de se manter nessa linha tênue, sem buscar redenção barata para Oswald Cobb, o que é um ponto positivo e uma escolha ousada.

    O enredo se apoia na briga de poder após a morte de Carmine Falcone, com o filho Alberto Falcone (Michael Zegen) assumindo o trono, até ser brutalmente assassinado por Oz. Essa morte fria e impiedosa nos dá o tom da série, reforçando que, em Gotham, a sobrevivência é para quem está disposto a fazer sacrifícios e Oz, mais do que qualquer um, parece pronto para qualquer coisa. A introdução de Alberto e o conflito entre ele e Oz servem como um catalisador perfeito para o caos que só cresce entre o restante da família Falcone.

    A morte de Alberto nas mãos do Pinguim, ao invés de ser meramente um ato de maldade, acaba revelando traços da personalidade desequilibrada de Oswald, além de um desprezo pelo poder estabelecido, sugerindo que ele não busca só o controle de Gotham, mas algo mais profundo: uma subversão total.

    Com uma narrativa intensa e personagens complexos, Pinguim revela a essência perturbadora de Gotham e promete moldar e revirar o futuro do universo de 'The Batman'.

    Pinguim | HBO | Max

    Ao longo da série, somos apresentados a dois personagens que dão ainda mais profundidade ao caos da série: Victor Aguilar (Rhenzy Feliz) e Sofia Falcone (Cristin Milioti) que entregam um verdadeiro espetáculo de atuação. Victor, um jovem que tenta sobreviver nos bairros pobres de Gotham, é pego tentando roubar peças do carro de Oz. O Pinguim, no entanto, não apenas o poupa, mas o faz seu “aliado”, desde que o rapaz o ajude a esconder o corpo de Alberto Falcone. Esse encontro com Oz acaba sendo o começo do fim para Victor, que, na tentativa de sobreviver, se envolve cada vez mais no submundo do crime. É uma história trágica que ressalta a perversidade de Oz: digamos que ele dá uma falsa escolha a Victor, mas o destino do jovem já está selado desde o momento em que cruza o caminho do Pinguim. Victor representa a juventude de Gotham, constantemente destruída pelo sistema e pelas figuras de poder.

    Já Sofia Falcone, filha de Carmine Falcone, surge como um contraste interessante. Ela é uma personagem marcada pela dor e pela vingança, moldada pelas decisões do próprio pai, que a usou como peão e a condenou ao Asilo Arkham por crimes que ela não cometeu. Seu tempo em Arkham apenas alimentou sua fúria e destruiu qualquer traço de sanidade que ela pudesse ter. Ao sair, Sofia é um misto de ódio e resiliência, determinada a vingar-se e a tomar o que julga ser seu por direito. Com a morte de seu irmão Alberto, o ódio reprimido de Sofia explode, tornando-se um desafio real para Oz. O apelido de “Carrasco” acaba realmente pegando por uma boa razão, e a rivalidade entre ela e Oz é um dos pontos mais intensos da trama, que vem sendo mostrado desde a época que Oswald trabalhava como motorista da família Falcone.

    A relação de Oz com Sofia e Victor deixa claro que, apesar de seu discurso sobre justiça social, ele só usa as pessoas para seu próprio ganho. Ele explora a empatia do público ao se posicionar como vítima da sociedade, destacando as desigualdades de Gotham e dando aos bairros pobres uma sensação de esperança. Contudo, é tudo uma manipulação: ele nunca busca ajudar de fato, apenas recruta essas pessoas como ferramentas para seus próprios fins.

    Com uma narrativa intensa e personagens complexos, Pinguim revela a essência perturbadora de Gotham e promete moldar e revirar o futuro do universo de 'The Batman'.

    Pinguim | HBO | Max

    No decorrer da série, somos introduzidos a Francis Cobb (Deirdre O’Connell), mãe de Oz, e entendemos a obsessão doentia de Pinguim por ela. O amor que Oz sente pela mãe é tão extremo que ele chega ao ponto de matar os próprios irmãos para garantir que Francis seja apenas dele. Esse relacionamento distorcido aprofunda ainda mais a complexidade de Oz, mostrando como suas conexões mais íntimas também moldaram seu caráter. É algo que nos faz questionar se, de algum modo, ele também é um “produto” das influências à sua volta ou se o próprio coração dele sempre foi dominado por essa frieza cruel.

    A brutalidade de Oz atinge um ponto alto quando ele queima vivos o filho e a esposa de Salvatore Maroni, mais um ato de crueldade que nos faz questionar até onde ele irá. Até que chega o momento em que o mesmo assassina Vic, seu jovem comparsa, de maneira gratuita e cruel, logo após o rapaz ajudá-lo a derrubar Sofia Falcone e a consolidar seu poder sobre Gotham. Essa morte é a gota d’água para o público que, até então, ainda mantinha algum tipo de compaixão por Oz. É aqui que percebemos a extensão da frieza dele: Vic, que poderia simbolizar alguma redenção ou laço genuíno, é apenas outra vítima descartável para Oz. O peso dessa morte é brutal, como se fosse uma última evidência de que o Pinguim é imutavelmente o diabo.

    O desfecho da série abre novas possibilidades. Com a nova queda de Sofia Falcone, a mesma é enviada de volta ao Asilo Arkham, onde recebe uma carta de sua meia-irmã Selina Kyle. Esse detalhe adiciona um gancho interessante, apontando para uma possível expansão do universo e quem sabe até um spin-off ou uma nova trama que pode ser explorada em “The Batman 2”.

    A Warner acerta em cheio com a série, tanto em termos de desenvolvimento de personagem quanto no universo sombrio e caótico que constrói ao redor do Pinguim. É uma produção que mantém a essência de Gotham e do Batman, deixando os fãs ansiosos por muito mais. Matt Reeves já deu indícios de que há mais surpresas a caminho, e, se esse primeiro arco é algum indicativo, o que vem a seguir promete ser ainda mais intenso. No final, a série do Pinguim fecha com um gostinho de “quero mais”, abrindo as portas para que esse vilão tão complexo mergulhe ainda mais fundo na escuridão de Gotham.

    Os 8 episódios de Pinguim já se encontram disponíveis na Max.

  • CRÍTICA| Como série de bruxaria, Agatha Desde Sempre é excelente

    CRÍTICA| Como série de bruxaria, Agatha Desde Sempre é excelente

    Agatha Desde Sempre prova seu potencial ao fugir de uma fórmula desgastada

    Caso você procure as séries da Marvel no IMDB (Internet Movie Database), todas estão incluídas dentro do subgênero de super herói, de Wandavision até Echo, porém, se você abrir a página de Agatha Desde Sempre, o primeiro subgênero é de fantasia sobrenatural, e isto diz muito sobre a série.

    Uma sequência direta de Wandavision, Agatha Desde Sempre foca na bruxa Agatha Harkness após ser libertada do encanto lançado pela Feiticeira Escarlate. Ao conhecer um adolescente, eles formam um coven para assim andarem o caminho das bruxas e buscarem os seus maiores desejos.

    Por conta de ser a primeira série do MCU pensada exclusivamente para o formato de série, e não um filme estendido por 6 horas, como Gavião Arqueiro e o tenebroso Invasão Secreta , e apresentando um orçamento mais modesto, o que permite muitas liberdades criativas, Agatha Desde Sempre tira sua força de três grandes pilares: atuação, roteiro e coragem.

    Em questão de atuação: Kathryn Hahn está super confortável de volta no papel, agora em seu momento de redenção, apresenta destaque, mas, se torna uma personagem secundária dentro da própria história, em pró de novos personagens como Aubrey Plaza, em uma personagem perfeita para o seu modo expansiva, e por Joe Locke, o grande destaque da produção, e a maior ligação com Wandavision.

    Agatha Desde Sempre

    Aubrey Plaza em cena de Agatha Desde Sempre- Divulgação/Disney

    Dentro de um universo fantástico que remete à produções juvenis dos anos 2000, o roteiro nos leva em uma jornada pequena, porém, muito bem construída, cada desafio do caminho das bruxas é único, seja uma espécie de escape 60, uma batalha de bandas, ou um jogo de tarot, cada parte permitindo que os personagens liberem o seu potencial.

    Apesar da produção apresentar maior liberdade do que outras do MCU, Agatha Desde Sempre se mantém no seguro, ousando principalmente em seus três últimos episódios, porém, perdendo oportunidades ao longo do resto da série de construir, entre muitas coisas, a primeira produção realmente de horror em 16 anos de produções Marvel.

    As 7 bruxas de Salem, o demônio durante a batalha de bandas, a possessão de Agatha no cenário anos 80, entre outros momentos, demonstram como a produção apresentava material para realmente trazer algo assustador, porém, perdendo estas oportunidades em pró de uma construção intimista de personagens que alcança seu auge nos 3 episódios finais.

    Um consenso entre os fãs da produção, é que o 7º episódio de Agatha Desde Sempre, Se a morte me encontrar, é o melhor da temporada. Focando na história pregressa de Lilia, o episódio é uma aula de construção narrativa em um tempo inferior à 30 minutos, lidando com diversas linhas temporais, evoluindo os personagens e trazendo uma maturidade que não explorada dentro do MCU.

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    Kathryn Hann e Joe Locke em cena de Agatha Desde Sempre- Divulgação/Disney

    O episódio 8, do mesmo modo que Wandavision, não consegue escapar do final dicotômico da maioria de produções da Marvel em que o bem luta contra o mal, sempre auxiliado por efeitos visuais. Em contrapartida, o episódio 9 de Agatha Desde Sempre traz um merecido descanso.

    Bruxa, Mãe e Algoz é o episódio mais lento em questão de ritmo, mostrando as origens de Agatha e do caminho das bruxas, porém, trazendo uma resolução e um conforto necessário dentro de uma produção que merece parabéns pela ousadia, apresentando como protagonista uma personagem praticamente desconhecida, ousando em questões sexuais que eram inexistentes em produções anteriores, e que com muita coragem e um bom roteiro, trouxe um respiro em um desgaste da fórmula do sub gênero de heróis.

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  • CRÍTICA I Ainda Estou Aqui é um retrato da luta pela memória e resistência

    CRÍTICA I Ainda Estou Aqui é um retrato da luta pela memória e resistência


    Walter Salles nos entrega, com “Ainda Estou Aqui”, uma reflexão densa e necessária sobre as cicatrizes deixadas pela ditadura militar no Brasil e a busca incansável por justiça.

    Adaptado do livro homônimo e autobiográfico de Marcelo Rubens Paiva (“Feliz Ano Velho”), o longa se destaca não apenas por seu conteúdo emocionalmente potente, mas também por sua relevância histórica. Aclamado em sua estreia no Festival de Veneza 2024, “Ainda Estou Aqui” foi escolhido para representar o Brasil na corrida pelo Oscar 2025, na categoria de Melhor Filme Internacional, reforçando sua importância tanto no cenário nacional quanto no internacional.

    Mais do que um simples longa, “Ainda Estou Aqui” vai além ao se consolidar como uma das produções mais marcantes do ano. Sua narrativa oferece um olhar profundamente humano sobre um dos períodos mais dolorosos da história recente do Brasil, tornando-se uma obra que ressoa intensamente com as feridas ainda abertas na sociedade.

    CRÍTICA I Ainda Estou Aqui é um retrato da luta pela memória e resistência
    Ainda Estou Aqui I Sony Pictures Entertainment


    A trama acompanha Eunice Paiva (Fernanda Torres/Fernanda Montenegro), uma mulher que se torna ativista após a captura de seu marido, Rubens (Selton Mello), pelo regime militar, em 1971. Esse evento traumático a imerge em uma luta pela memória e pela verdade, enquanto busca entender o destino de Rubens e lida com o impacto emocional em si e em seus filhos.

    Sob a direção sensível de Walter Salles (“Central do Brasil”), o filme não se limita a uma representação crua e direta da brutalidade do regime militar. Salles opta por um enfoque mais introspectivo, ao explorar o sofrimento interno de Eunice e as consequências silenciosas, mas devastadoras, da repressão. A dor psicológica e o luto incerto da personagem são apresentados de forma sutil e angustiante, criando uma narrativa que mescla memória e realidade de maneira a transcender a individualidade, tocando em questões universais.

    A atuação de Fernanda Torres (“Terra Estrangeira”) é o coração do longa. Ela incorpora uma Eunice forte, mas, ao mesmo tempo, vulnerável, uma mulher que carrega a dor da perda e da incerteza, mas que transforma esse sofrimento em resistência. Já Fernanda Montenegro (“A Vida Invisível”), em uma participação breve, mas impactante, dá vida à versão mais velha de Eunice, encerrando o ciclo da personagem com a profundidade e a sensibilidade, que só uma atriz de seu calibre poderia trazer.

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    Ainda Estou Aqui I Sony Pictures Entertainment


    Além das atuações memoráveis, o longa também se destaca tecnicamente. A fotografia, de Adrian Teijido (“Medida Provisória”), recria com precisão a atmosfera dos anos 70 no Rio de Janeiro, equilibrando a nostalgia de um período que se perde e a opressão do contexto político. A paleta de cores escolhida, junto com a estética visual, reforça essa dualidade entre os momentos alegres que antecedem a tragédia e o ambiente sufocante da ditadura. O uso de material de arquivo e de noticiários da época, entremeados à narrativa, conecta a ficção à realidade histórica de maneira autêntica e eficaz, lembrando o espectador da importância de manter viva a memória coletiva.

    A reconstituição de cenários também merece destaque. Sob a direção de arte de Carlos Conti (“Diários de Motocicleta”), os espaços recriados transportam o espectador para o clima de constante vigilância e incerteza que predominava na época. O figurino, assinado por Claudia Kopke (“Tropa de Elite”), complementa essa ambientação, sendo fiel à moda e aos costumes das décadas retratadas.

    A transição entre os anos 70 e 90, que marca diferentes fases da vida de Eunice, é conduzida com fluidez e precisão, permitindo ao filme explorar a evolução da luta não só de Eunice, mas também de seu filho, Marcelo Rubens Paiva (Antônio Saboia). Marcelo se torna uma figura fundamental na discussão sobre a “Lei dos Desaparecidos”, sancionada por Fernando Henrique Cardoso nos anos 90, o que adiciona uma camada extra de profundidade ao enredo.

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    Ainda Estou Aqui I Sony Pictures Entertainment


    O desfecho é comovente e profundamente simbólico. Salles opta por um final que não apela para o sensacionalismo ou para cenas de violência explícita. Em vez disso, o diretor foca na intimidade emocional de Eunice, lembrando o público de que o impacto da repressão vai além do sofrimento físico — ele permeia gerações e deixa cicatrizes que nunca se fecham completamente. A escolha de encerrar a narrativa com Fernanda Montenegro em uma atuação silenciosa, mas arrebatadora, reafirma a mensagem central da obra: a memória e a resistência são armas poderosas contra o esquecimento.

    Em última análise, “Ainda Estou Aqui” é um filme que vai além de sua função como uma biografia ou um relato histórico. Ele se apresenta como um retrato pungente de um país que ainda luta para superar as sombras do seu passado. Walter Salles, com sua direção delicada e precisa, oferece ao público uma experiência cinematográfica visceral e emocionalmente envolvente, onde a dor pessoal se entrelaça com a reflexão política.

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    Ainda Estou Aqui I Sony Pictures Entertainment


    À medida que a temporada de premiações se desenrola, “Ainda Estou Aqui” se posiciona como um forte candidato ao Oscar de Melhor Filme Internacional, e, quem sabe, poderá se consolidar como um marco no cinema brasileiro, tal como “Central do Brasil” foi, em 1998.

    Mas, independentemente de prêmios, a obra já é uma conquista significativa, ao oferecer um espaço para a reflexão sobre a importância da memória e da resistência em tempos de repressão.

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  • CRÍTICA | Anora atualiza Cinderela e nos derruba no processo

    CRÍTICA | Anora atualiza Cinderela e nos derruba no processo

    Vencedor da palma de ouro no Festival de Cannes, Anora mistura comédia e drama para fazer um retrato honesto do mundo atual

    Escrito pelos Irmãos Grimm, o conto da “Gata Borralheira”, ou “Cinderela” como é mais popularmente conhecido, apresenta a seguinte frase no momento que Cinderela dança com o príncipe: “Tanto tempo vivendo em meio às cinzas, agora ela estava vivendo em esplendor e felicidade”.

    Dirigido por Sean Baker, Anora pode ser considerado uma atualização desta história secular. Na produção, a princesa é uma gentil e carismática stripper chamada Ani, Mikey Madison, que se casa impulsivamente com um jovem oligarca russo chamado Ivan, Mark Eidelshtein, tendo a oportunidade de finalmente alcançar uma vida de luxo e glamour que sempre quis.

    Inicialmente se assemelhando a outras produções como Podres de Ricos (2018) e mais especificamente Uma Linda Mulher (1990), Anora se mostra bem maior do que ambos estas produções por conta de uma junção de fatores, que inclusive fizeram o filme vencer a palma de ouro do festival de Cannes 2024.

    O primeiro fator é elenco. Mikey Madison é a melhor escolha possível para o papel de Anora, uma mulher leve, engraçada e ao mesmo tempo extremamente decidida e confiante. Ao longo de duas horas presenciamos todo um espectro de emoções que variam desde a alegria até às lágrimas. É um papel que não tem medo de demonstrar suas inúmeras qualidades, do mesmo modo que suas falhas. Junto com sua protagonista, um elenco secundário compõem esta farsa, principalmente no segundo ato do filme quando o filme deixa de ser uma comédia romântica e se torna um filme de absurdos que abraça o caos de uma maneira que poucos filmes apresentam coragem.

    O segundo fator é o roteiro e a direção de Sean Baker. O que poderia ser um romance que seria esquecido após um tempo, é na verdade um misto de comédia, absurdos e drama. Por bem ou por mal, Baker pula corda com isto. No primeiro momento rimos da situação, em seguida, após a catarse, refletimos sobre o porque rimos daquela situação, algo constante em toda a produção.

    O terceiro e principal fator é a veracidade de seu roteiro. Enquanto comédias românticas como Uma Linda Mulher (1990) constroem um universo fantástico que testa a crença do espectador, em Anora nós sentimos que é real, sentimos empatia com Ani, queremos que ela alcance seu sonho, não o de amor pois em nenhum momento acreditamos que ela realmente ama Ivan, especificamente porque o personagem é construído de maneira tão imatura que nunca teria futuro com alguém complexo quanto Ani, mas o sonho de ser algo mais dentro da vida, algo que todos nós sonhamos alguma vez na vida.

    Anora

    Pôster Oficial de “Anora”- Divulgação da Focus Pictures

    A trilha sonora composta de músicas como All The Things That She Said de t.A.T.u, a cinematografia que constrói um universo fantástico e lúdico para Ani, que fica cada vez mais real na medida que o filme avança, piadas que variam do sorriso de canto de boca até chorar de rir, trazendo uma sensação de conforto para o espectador, para ao final quebrar todo este sonho anteriormente apresentado.

    A realidade não é um conto de fadas, isto que Baker quer nos lembrar com um último ato que nos deixa sem resposta. Após uma jornada diretamente tirada de um filme dos anos 80, somos lembrados de como ao final do dia, pessoas cometem erros e não arcam com eles, de como somos obrigados a certos papéis por conta de nossas escolhas, de como é difícil encontrar apoio em um mundo cada vez mais frio, de como às vezes a gente só precisa de um abraço.

    Anora é um filme corajoso, fugindo de clichês românticos ultrapassados, trazendo para a realidade e tomando decisões ousadas a cada momento. Focando todo o primeiro ato no relacionamento de Anora e Ivan, para o homem desaparecer pela totalidade do segundo ato, deixando Ani e o espectador questionando esta ausência, enquanto a realidade idílica construída anteriormente, é derrubada sem piedade por meio de um absurdo atrás do outro, demonstrando que no final, por mais que Anora e o próprio espectador desejem muito, na grande maioria das vezes, a Cinderela não alcança seu final feliz.

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  • CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | O Império falha em alcançar seu potencial como sátira

    CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | O Império falha em alcançar seu potencial como sátira

    Dirigido por Bruno Dumond, O Império se perde em roteiro confuso e ensosso ao satirizar o gênero de ficção cientifica.

    Em 1987, no auge da fama de Star Wars, Mel Brooks lançou S.O.S- Tem um Louco Solto no Espaço (Space Balls), satirizando o gênero da ficção cientifica de modo original e cômico, trazendo uma nova visão para este mundo épico apresentado por George Lucas que se mantém em alta, entre altos e baixos, até os dias de hoje.

    Justamente este sucesso constante de Star Wars, somado com lançamentos recentes como Duna, que permitiu O Império satirizar marcas do gênero como: o modelo dicotômico da luta do bem contra o mal, o escolhido que deve ser protegido, um imperador que quer dominar tudo, entre outros, porém, enquanto Mel Brooks acertou com louvor, tendo sido anunciado uma sequência para ser lançada quase 40 anos depois, o filme de Bruno Dumond não apresenta nenhum brilho, nem como forma de paródia e nem como filme independente.

    Em O Império, somos apresentados aos 0’s, “os sith“, e aos 1’s, “os jedis“, duas raças alienígenas que representam o bem e o mal e se encontram em exílio na terra, na forma de humanos. Quando nasce o filho da união entre um 0 e um 1, ambos os impérios apresentam planos particulares para a criança.

    O Império

    O que se segue é uma trama confusa, com um humor francês típico, ou seja, não é produzido para gargalhar alto e sim para dar vários risinhos de canto de boca por conta de absurdos apresentados ao longo do filme, porém, um roteiro inflado e confuso, recheado de personagens que não apresentam marcas únicas e são unidimensionais em um nível absurdo, fazem com que O Império perca sua força.

    Tirar todo o glamour e a magia de Star Wars, para colocar em um universo comum e real como Costa Opal, é uma premissa interessante, porém, chega o momento que estes dois universos, o grandioso e fantástico, e o terreno e chato, se tornam conflitantes demais, trazendo um sentimento de desprezo da parte do espectador.

    Seus personagens também não auxiliam, uma história secundária do filme ocorre quando a princesa dos 1’s, Anamaria Vartolomei, se apaixona pelo príncipe dos 0’s, Brandon Vlieghe, porém, seu relacionamento não é aprofundado, e para piorar a situação, pode ser compreendido que a princesa somente apresenta interesse no príncipe por conta de ele a ter apresentado os prazeres do sexo, o que demonstra um forte problema em O Império: o trato com personagens femininas.

    Em pleno século XXI, é inadmissível um filme, seja ele francês, americano, brasileiro, ou qualquer outro país. Apresentar tanto descaso com personagens femininas, quanto O Império apresenta. Além do fato de as duas principais personagens mulheres da produção se odiarem do começo ao fim do filme por conta de uma ser um 0, Line, e a outra um 1, a princesa Jane. Ambas não saem da camada unidimensional, principalmente Line, e servem somente para movimentar a narrativa da maneira mais básica possível, sem contar o seu uso para piadas machistas, de diversas formas.

    O trailer promete um filme muito mais interessante do que aquilo que foi entregue por Dumond, apresentando uma ou duas piadas que realmente funcionam, enquanto sentimos confusão e vergonha alheia por conta de acontecimentos e diálogos.

    O Império pode ser considerado um filme trash francês, isto não seria um problema se a produção brincasse com isto, porém, ao tentar levar a sério, em um filme galhofa, conceitos como a filosofia sobre o bem e o mal interno em cada um da humanidade, a produção encerra de forma absurda e vazia, como se a produção tivesse esquecido de filmar o final, assim, somando na crítica de que uma sátira deste escopo, dirigido por um nome renomado no cinema francês, poderia ter gastado um tempo maior em seu desenvolvimento e construído algo realmente grandioso.

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  • CRÍTICA (FESTIVAL RIO) | O Aroma do Pasto Recém Cortado: Um filme de recasamento

    CRÍTICA (FESTIVAL RIO) | O Aroma do Pasto Recém Cortado: Um filme de recasamento

    Dirigido por Celina Murga, O Aroma do Pasto Recém Cortado usa traição para contar uma história de reconciliação

    No livro Pursuits of Happiness: A Hollywood Comedy of Remarriage (1981), o filósofo e teórico americano Stanley Cavell se baseia em comédias românticas da época de ouro de Hollywood, como Levada da Breca (1938) de Howard Hawks e A Costela de Adão (1949) de George Cuckor, para explorar o gênero de recasamento, na qual, ao invés da produção tentar juntar um casal, ele busca trazer de volta a sua união que foi perdida.

    O Aroma do Pasto Recém Cortado conta a história de Pablo e Natalia, dois professores universitários casados, com filhos, e em crise matrimonial. No momento que ele inicia um caso com uma aluna e ela inicia um caso com um aluno, são originadas diversas situações imagéticas que ocasionam consequências em seus próprios casamentos.

    O Aroma do Pasto Recém Cortado é uma coprodução da Argentina, Uruguai, México, Alemanha e EUA, com a presença de Martin Scorcese, um diretor renomado e amante declamado da sétima arte, como produtor executivo, assim, a influência deste gênero de recasamento não se encontra tão longe, principalmente por conta de três marcas analisadas por Cavell: o diálogo constante, a presença do divórcio e a igualdade de gêneros.

    A produção de Celina Murga apresenta diálogos pontuais, que se somam a diversos momentos contemplativos e de calma, principalmente para dar tempo ao observador embarcar nesta jornada junto com seus protagonistas; O divórcio se apresenta sempre na iminência, porém, nunca colocado como uma real possibilidade; a igualdade de gêneros se encontra por meio de um co-protagonismo dividido por Pablo e Natalia.

    O Aroma do Pasto Recém Cortado

    “O Aroma do Pasto Recém Cortado”- Foto divulgada pelo Festival do Rio

    O Aroma do Pasto Recém Cortado constrói sua narrativa com base em semelhanças imagéticas entre a jornada de ambos. Tanto Pablo quanto Natalia, apesar de não compartilharem cenas durante toda a produção, apresentam casos com alunos; ambos inicialmente negam este sentimento; ambos encontram uma felicidade que se perdeu em seus próprios matrimônios, entre outras semelhanças que nos trazem duas diferentes versões da mesma história.

    Após ambos terem seus relacionamentos descobertos, ao invés de O Aroma do Pasto Recém Cortado se transformar em um drama que diretores como Woody Allen fazem no nível da exaustão, se baseando no ridículo de um de seus protagonistas e uma espécie de mea culpa. A produção mantém o seu ritmo lento e contemplativo, em nenhum momentos os casais gritam entre si, porém, na medida que os respectivos conjugues de Pablo e Natalia aceitam com tanta calma esta infidelidade, a dor que sentimos é muito maior.

    O filme demarca o desgaste do amor por meio de jogos de iluminação, um exemplo é a casa de Pablo que é sempre escura, enquanto quando está com sua amante é muito mais iluminada, algo semelhante para o que ocorre com Natalia.

    A produção é lenta, não apresentando grandes momentos de catarse e cansando o espectador ao acompanharmos a mesma história duas vezes, seja a versão de Natalia ou a de Pablo. Ao seu final, O Aroma do Pasto Recém Cortado, traz um sentimento agridoce, não sentimos que nenhum dos protagonistas realmente sofreram as consequências por suas atitudes, porém, observar como este acontecimento, seja ele errado ou não, ocasiona no que Cavell definiu como recasamento, traz um sentimento de conforto. Talvez o casamento de ambos não dure muito tempo depois do filme, porém, naquele momento eles encontraram um pouco de felicidade.

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  • CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Herege é uma aula de filosofia e depois um filme de terror

    CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Herege é uma aula de filosofia e depois um filme de terror

    Dirigido por Scott Beck e Bryan Woods, Herege se utiliza de símbolos para construir reflexões sobre crenças e fé

    Aqueles que assistirem Herege esperando um filme de terror puro e simples, provavelmente sairão decepcionados. O filme apresenta um ritmo lento, focando muito em diálogos e auxiliado por uma fotografia de destaque, marca de filmes da produtora A24.

    Desde o primeiro plano de Herege, é demonstrado o quanto o ser humano é pequeno em comparação ao mundo, enfatizando uma enorme montanha ao fundo e as duas protagonistas em primeiro plano: Irmã Barnes, Sophie Tatcher, e a Irmã Paxton, Chloe East. Quando estas jovens missionárias são obrigadas a participar de um jogo filosófico na casa de Mr Reed, Hugh Grant, ambas são obrigadas a testar sua fé, enquanto a audiência se diverte com reflexões que variam desde relações entre Monopoly e Judaísmo, até as comparações rítmicas entre as músicas The Air That I Breath de The Hollies e Creep de Radiohead.

    Apesar de apresentar traços de filmes de terror, como um porão escuro e uma tensão constante aonde não sabemos o que pode acontecer em seguida, o grande foco da produção é o roteiro, principalmente seus diálogos e suas comparações ao discutir algo tão pessoal e ao mesmo tempo tão vasto dentro da nossa sociedade atual: Religião.

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    Sophie Tatcher e Chloe East em cena de “Herege”- Foto divulgada pelo Festival do Rio

    Herege não pretende converter ninguém, respeitando as crenças, e não crenças de cada um, porém, não poupa esforços ao demonstrar contradições e fragilidades dentro de cada sistema religioso do mundo. Cristianismo, Judaísmo, Islamismo, Mitologia Grega, Hinduísmo, tudo é discutido no filme. Aos amantes de reflexões sobre a vida e a humanidade, este filme é um prato cheio, permitindo a audiência passar horas no bar entrando fundo neste buraco de coelho construído por Beck e Woods.

    Apesar de toda a produção apresentar um ritmo lento, a primeira metade de Herege é ao extremo, dando prioridade em apresentar o contexto filosófico e reflexivo necessário para a audiência sentir a tensão do segundo ato da produção.

    Neste momento Herege se torna um terror mais clássico, muito por conta da aparição de uma sacerdotisa, o “monstro” do porão, por assim dizer, porém, o verdadeiro horror do filme se encontra na frieza de Mr Reed, um homem sem um pingo de empatia e focado somente em demonstrar como as contradições da fé são aceitas pela humanidade como algo natural, ao invés de ser discutida por suas contradições.

    Em seu último ato, Herege se torna um filme mais fantástico, na medida que Beck e Woods testam a fé do espectador, construindo atos e ações irreais, brincando com a consciência do espectador sobre o que aconteceu ao longo da produção.

    Ao final, Herege pode não ser o filme de terror do ano, mas, cumpre o seu papel por meio de cenas tensas, traz o melhor papel de Hugh Grant em anos, talvez da carreira, e faz a audiência refletir sobre em que acredita, entregando boas atuações e um roteiro cirúrgico.

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  • CRÍTICA I Força Bruta: Uma Boa Ação Sul-Coreana, mas nada além disso

    CRÍTICA I Força Bruta: Uma Boa Ação Sul-Coreana, mas nada além disso

    “Força Bruta” entrega adrenalina, mas fica aquém em enredo e desenvolvimento de personagens.

    A vitória de “Parasita” (2019) no Oscar 2020 foi um marco decisivo para o cinema sul-coreano, elevando suas produções a um novo patamar de reconhecimento internacional. Ao vencer a categoria de “Melhor Filme”, “Parasita” mostrou que o mercado asiático poderia transcender fronteiras e conquistar o público global, abrindo portas para que outros gêneros também ganhem espaço no mercado internacional.

    Chegamos à 2024, quando estreia nos cinemas “Força Bruta”, uma aposta da Coreia do Sul, desta vez no gênero de ação, buscando atrair um público mais amplo e diversificar ainda mais a oferta cinematográfica do país.

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    Força Bruta I ABO Entertainment

    Estrelado por Don Lee (“Os Eternos”), o longa apresenta uma trama simples que remete a clássicos como “Stallone Cobra” (1986) e “Police Story” (1985), além de lembrar bastante a filmografia do ator Steven Seagal (“A Força em Alerta”), ou até mesmo do expoente também asiático, Jackie Chan (“A Hora do Rush”). O enredo é repleto de clichês e situações já familiares, mas a enérgica atuação de Lee é o que impede o filme de cair no esquecimento.

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    Força Bruta I ABO Entertainment

    Ambientado em 2008, durante um período de crescente violência na Coreia do Sul e no Vietnã, a história segue o policial Ma Seok-do (Lee) e o Capitão Jeon Il-man (Guy-hwa Choi), que são enviados ao Vietnã para capturar um suspeito. Durante o interrogatório, eles descobrem uma grande rede de tráfico liderada pelo vilão Hae-sang (Son Suk-ku).

    Apesar da trama simples, a grande quantidade de antagonistas rasos confunde o público, dificultando identificar quem realmente importa. Tanto os heróis quanto os vilões carecem de profundidade.

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    Força Bruta I ABO Entertainment


    Por outro lado, o protagonista compensa com seu tom cômico, mantendo o filme leve, apesar de sua invencibilidade exagerada que tira parte da tensão. Mas o ponto alto mesmo reside nas cenas de ação. A brutalidade das lutas, bem coreografadas, faz jus ao título, entregando momentos intensos e cheios de adrenalina.

    Juntando tudo isso, no fim, “Força Bruta” é um filme mediano. Funciona como um entretenimento simples e direto, mas não oferece muito além disso. O enredo previsível e os personagens superficiais limitam seu impacto, fazendo com que pareça voltado para bombar nas plataformas de streaming. Ainda assim, deve agradar quem procura diversão descompromissada.

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  • CRÍTICA I “O Aprendiz”: Uma Sátira Polêmica sobre a ascensão de Donald Trump

    CRÍTICA I “O Aprendiz”: Uma Sátira Polêmica sobre a ascensão de Donald Trump

    O Aprendiz” traz um retrato controverso da vida do bilionário republicano, em tempos de eleição.

    “O Aprendiz”, sob a direção de Ali Abbasi (“Shelley”), exibido no Festival de Cannes 2024, se concentra na complexa trajetória de Donald Trump, numa cinebiografia que entrelaça eventos históricos com provocações políticas. Anunciado em 2018, o filme ganhou notoriedade ao ser lançado durante as eleições presidenciais nos Estados Unidos em 2024, intensificando as controvérsias que cercam a figura do ex-presidente. Mais do que uma crítica simplista, “O Aprendiz” investiga diversas facetas do protagonista, revelando nuances de sua personalidade e ambições.

    Desde o início, a produção enfrentou polêmicas, especialmente relacionadas ao financiamento de Dan Snyder, um bilionário que acreditava estar apoiando uma representação positiva de Trump. Contudo, ao visualizar o corte final, Snyder processou a produtora, alegando ter sido enganado. Além desse contratempo, apoiadores de Trump ameaçaram ações legais, evidenciando a tensão em torno da figura do ex-presidente e o impacto que a obra poderia ter em sua imagem pública.

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    Força Bruta I Diamond Films

    Ainda assim, apesar das controvérsias, “O Aprendiz” não se restringe a uma visão negativa de Trump. O filme analisa a relação do ex-presidente com o desenvolvimento econômico de Nova York, destacando sua habilidade em identificar e aproveitar oportunidades. A narrativa se concentra em como o jovem Donald Trump (Sebastian Stan), começou sua trajetória empresarial na cidade durante as décadas de 1970 e 1980.

    Sebastian Stan (“Capitão América: O Soldado Invernal”), entrega uma performance impressionante, capturando a evolução do discurso e comportamento de Trump. Ele retrata habilmente a transformação do personagem, desde a juventude até sua ascensão ao poder. No elenco de apoio, Jeremy Strong (“Os 7 de Chicago”), interpreta Roy Cohn, advogado e mentor de Trump. Cohn, cuja rede de contatos e insegurança são elementos cruciais, desempenha um papel fundamental na construção do carisma e do sucesso do empresário.

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    Força Bruta I Diamond Films

    A relação entre Trump e Cohn, por sinal, emerge como um dos pontos centrais do filme, ressaltando como as conexões políticas foram determinantes para a ascensão de Trump. O roteiro, escrito por Gabriel Sherman (“Independence Day: O Ressurgimento”), aborda momentos históricos significativos, como a saída de Nixon da presidência. A forma como Trump explorou o caos político da época também é enfatizada, mostrando sua capacidade de navegar em tempos conturbados.

    A parte técnica do longa é igualmente impressionante. A fotografia de Kasper Tuxen Andersen (“A Pior Pessoa do Mundo”), se destaca ao utilizar um granulado que confere um ar quase documental às imagens. Essa abordagem, combinada com a maquiagem de Brandi Boulet (“O Regresso”), aumenta a imersão na Nova York dos anos 70 e 80, transportando o público para aquela época vibrante e tumultuada.

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    Força Bruta I Diamond Films

    Ali Abbasi utiliza sua direção para criar um clima de espionagem e tensão. A câmera frequentemente se aproxima de Trump, intensificando a sensação de obscuridade e mistério em suas ações. Essa escolha estilística ajuda a construir uma narrativa que não apenas informa, mas também instiga a curiosidade do espectador.

    Além das questões políticas e empresariais, o filme também explora a vida pessoal de Trump. A tumultuada relação com sua primeira esposa, Ivana, interpretada por Maria Bakalova (“Borat: Fita de Cinema Seguinte”), é revelada, oferecendo um lado menos conhecido e mais emocional do protagonista. Essa dimensão humana acrescenta profundidade à narrativa, mostrando que por trás da figura pública existe um ser humano com conflitos e vulnerabilidades.

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    Força Bruta I Diamond Films

    A interação de Trump com a mídia, elemento crucial para sua ascensão, é apresentada de forma intrigante. O filme ilustra como ele manipulou essa relação a seu favor, explorando a cobertura midiática para construir sua imagem.

    No final, apesar de algumas oscilações no ritmo, “O Aprendiz” se revela uma cinebiografia audaciosa e bem estruturada, equilibrando crítica e análise de maneira instigante. A sátira proposta provoca reflexões profundas sobre a política e a sociedade, sem perder o viés de entretenimento. A obra oferece uma crítica social inteligente e pertinente, convidando o público a reconsiderar a figura de Donald Trump e seu impacto na política americana contemporânea.

    Com uma narrativa rica e envolvente, “O Aprendiz” se destaca como uma reflexão oportuna sobre o fenômeno Trump, consolidando-se como uma produção digna de atenção, tanto para seus fãs quanto para seus detratores. A obra não apenas informa, mas também provoca discussões relevantes, destacando a complexidade do personagem e as implicações de sua trajetória na sociedade atual.

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  • CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Meu Nome é Maria é uma necessária reparação histórica

    CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Meu Nome é Maria é uma necessária reparação histórica

    Meu Nome é Maria faz um retrato necessário da vida de Maria Schneider antes e após O Último Tango em Paris

    Na mitologia grega, Cassandra foi uma princesa troiana amaldiçoada pelo deus Apolo, apresentava o dom da profecia, porém, ninguém jamais acreditava nela. Estudiosos utilizam Cassandra como um modo de retratar o silêncio imposto em mulheres dentro da sociedade, não apresentando a possibilidade de falarem, ou, ao falarem, serem questionadas sobre a veracidade em sua fala.

    Dirigido por Jessica Palud, Meu Nome é Maria conta a história de Maria Schneider, a jovem de 19 anos que contracenou com Marlon Brando em O Último Tango em Paris (1972).

    O Último Tango em Paris continua impactando no ano de 2024. A história de um casal que decide viver histórias de luxúria em um apartamento, sem saber nem mesmo o nome de seu companheiro, e vivenciando os desejos mais carnais e sinceros, tornou o filme uma das produções cinematográficas mais discutidas de todas, principalmente por conta da cena do estupro de Maria Schneider pela parte de Marlon Brando e o diretor Bernardo Bertolucci.

    Anamaria Vartolomei, como Maria, e Matt Dillon, em uma caricatura de Marlon Brando, estão excelentes em seus respectivos papéis. Palud representa com muita beleza o brilho natural de Maria Schneider e Anamaria trespassa isso ao espectador com um único olhar, trazendo uma sutileza e doçura à personagem, porém, é este mesmo olhar que nos destrói ao chegar a famosa cena do estupro.

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    Anamaria Vartolomei em cena de “Meu Nome é Maria”- Foto divulgada pelo Festival do Rio

    A cena que foi refilmada para Meu Nome é Maria, consegue ser ainda mais terrível do que a cena filmada por Bertolluci, por dois motivos específicos: a onisciência do público que sabia da iminência daquele momento, e pelo close nas reações de dor de Maria, algo que nem mesmo Bertolluci fez em seu filme, mantendo a câmera mais distante.

    Meu Nome é Maria cumpre o papel não de cinebiografia, mas de reparação histórica. Brando, Bertolluci e Maria já faleceram. O ato cometido com a jovem de 19 anos nunca foi dignamente discutido em público, afinal, foi escondido da indústria por conta de questões jurídicas e sociais que afetariam principalmente Maria, sendo aconselhada até mesmo pelo pai a se manter calada.

    Do mesmo modo que uma Cassandra contemporânea, se Maria falasse tudo que sofreu, duvidariam da veracidade de suas palavras, e tristemente o movimento #MeToo surgiu somente em 2017, 6 anos após sua morte.

    Meu Nome é Maria apresenta duas Marias distintas, a primeira vive com a mãe e se aproveita dos contatos que o pai apresenta dentro da indústria cinematográfica, é sonhadora, determinada, corajosa, engraçada e em certo nível inocente, apresentando longas conversas com Brando que geram no espectador um falso senso de segurança da parte do homem. A segunda Maria Schneider se apresenta após do crime ocorrido no set de O Último Tango em Paris, uma Maria mais madura, destruída, com receio de se abrir, menosprezada pela indústria, viciada em drogas, que encontra um novo amor, mas, o destrói por conta de seu próprio comportamento.

    Jessica Palud constrói uma demarcação clara entre estas duas Marias, principalmente por meio da atuação de Anamaria Vartolomei, que amadurece na nossa frente na medida que enxergamos como Maria Schneider lida com o trauma e a humilhação causadas por homens como Brando e principalmente por Bernardo Bertolucci, colocado no filme como a verdadeira força antagônica, sendo uma representação do impacto que homens causam em mulheres de todo o mundo.

    Meu Nome é Maria

    Anamaria Vartolomei em cena de “Meu Nome é Maria”- Foto Divulgada pelo Festival do Rio

    Meu Nome é Maria é um pedido de desculpas para Maria Schneider, uma jovem que jamais se recuperou após ter sido abusada, humilhada e desprezada pela indústria cinematográfica, após sofrer uma crime orquestrado por dois homens, em posição de autoridade, e apoiados por inúmeros cúmplices silenciosos que não interferiram, apesar da dor legítima de Maria.

    Meu Nome é Maria é um filme forte que expõe uma verdade oculta por tempo demais. É estruturado de forma que o espectador apresenta vontade de resgatar Maria e avisá-la de tudo que a espera, porém, isto não ocorre, e somente podemos sentar e ver o brilho de uma mulher ir sumindo aos poucos.

    Até onde sabemos, Milton Nascimento em sua música “Maria, Maria” , não canta sobre Maria Schneider e não apresenta relações com Meu Nome é Maria, porém, a descrição de dor e alegria que ela apresentou ao longo da vida, esta luta por manter a alegria e a determinação apesar de tudo, e a sua perseverança que Jessica Palud representa tão bem, é algo vivido por muitas mulheres até os dias de hoje, é resumida de modo lúdico por meio das seguintes estrofes da música:

    “Maria, Maria, é o som, é a cor, é o suor
    É a dose mais forte e lenta
    De uma gente que ri quando deve chorar
    E não vive, apenas aguenta

    Mas é preciso ter força, é preciso ter raça
    É preciso ter gana sempre
    Quem traz no corpo a marca, Maria, Maria
    Mistura a dor e a alegria”

    Hoje conseguimos reconhecer a força de Maria Schneider e como a julgamos mal, e isto é o mínimo para ela ter um pouco da tão merecida paz que buscou ao longo de sua vida.

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    CRÍTICA (FESTIVAL RIO)| Todo o Tempo que Temos é feito sob medida para emocionar

    Dirigido por John Crowley, Todo o Tempo que Temos segura o elenco, porém, não traz novidades ao gênero.

    O gênero da comédia romântica é mais antigo do que o próprio cinema. No século XVI, William Shakespeare já havia escrito Sonho de Uma Noite de Verão , Muito Barulho por Nada e outras peças do gênero, porém, mesmo naquela época não era considerado original pois os gregos já haviam produzidos peças que inspiraram Shakespeare, e por consequência inspiram cineastas até hoje, em uma espécie de Atlas Mnemosyne.

    Recentemente, graças em grande parte à NETFLIX e outros serviços de streaming, estamos vivendo uma nova era de comédias românticas, um gênero que é reinventado a cada 10 ou 15 anos. Todo o Tempo que Temos se encontra nesta fase mais recente, uma fase que se baseia em pegar dois atores de renome, no caso Andrew Garfield e Florence Pugh, e colocá-los para vivenciar todas as aventuras e desaventuras de um casal, desde o clássico meet cute, a briga desnecessária, a reconciliação, a batalha entre emprego e amor, a vida familiar, entre outras.

    Todo o Tempo que Temos apresenta uma narrativa não linear para contar a história da chef de cozinha Almut, Florence Pugh, e do recém-divorciado Tobias, Andrew Garfield. O diretor John Crowley, juntamente com o roteirista Nick Payne, orquestram uma narrativa que nos diverte, porém, não acrescentando nada novo ao gênero. Na superfície aparenta ser uma novidade, porém, isto só se mantém por conta da química de Garfield e Pugh, dois excelentes atores muito confortáveis dentro do papel.

    Todo o Tempo que temos

    Florence Pugh em cena de “Todo o Tempo que Temos”- Foto divulgada pelo Festival do Rio

    Todo o Tempo que Temos levou grande parte da audiência que assistiu este filme no 26º Festival do Rio, a cair em lágrimas, algumas a soluçar. Isto acontece por conta do filme ter sido feito sob medida para nos fazer chorar, incluindo o, já batido, arco narrativo de um membro do casal apresentar câncer, algo já visto em produções como A Culpa é Das Estrelas (2014), O Amor Pode Dar Certo (2006), entre outras inúmeras produções dos últimos 20 anos, sendo na maioria das vezes a mulher que apresenta a doença, porém, câncer é uma doença tão pesada e discutida, que aterroriza até mesmo os mais corajosos, gerando a empatia do público para com o casal principal.

    Apesar de interessante em algumas cenas, Todo o Tempo Que Temos é uma comédia romântica decente, porém, somente isso, não acrescentando nada de novo ao lore já existente, seguindo uma estrutura segura e feita para emocionar, assim, garantindo o sucesso do filme por meio de um trailer que emociona mais do que o filme em si, e o marketing de dois grandes atores do cinema contemporâneo, que se torna mais interessante e inovadora do que a história do filme em si.

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  • CRÍTICA (FESTIVAL RIO) |Enterre Seus Mortos se inicia muito bem e fracassa no resto

    CRÍTICA (FESTIVAL RIO) |Enterre Seus Mortos se inicia muito bem e fracassa no resto

    Apesar de Selton Mello e da direção de Marco Dutra, Enterre Seus Mortos é um filme vazio de conteúdo.

    Na primeira cena de Enterre Seus Mortos, vemos um cavalo atravessado na parte traseira de um carro, um morto na estrada, e dois homens que chegam para resgatar o animal, ignorando o homem implorando por ajuda, que se encontra preso no banco da frente do carro, destruído pelo corpo do equino.

    Baseado no livro homônimo de Ana Paula Maia, Enterre Seus Mortos acompanha Edgar Wilson, Selton Mello, e o ex padre Tomás, Danilo Grangheia, dois homens responsáveis por recolherem animais mortos na estrada, dentro de um mundo pós apocalíptico, porém, diferente de outros mundos pós apocalípticos presentes no nosso inconsciente coletivo, como o de Exterminador Do Futuro e Mad Max: Estrada da Fúria, o mundo de Marco Dutra nunca se apresenta tão terrível quanto deveria.

    Isto é um problema comum a todo a produção: tentar chocar, porém, sem apresentar força ou contexto suficiente para transmitir qualquer forma de empatia do espectador para com seus personagens.

    Incluindo diversas alegorias bíblicas em seu desenvolvimento, incluindo, mas não limitado a: os 4 cavaleiros do apocalipse, o filme apresentar 7 capítulos, uma chuva de sapos como uma das pragas do Egito Antigo, entre outras. Porém, esta quantidade de alegorias bíblicas dentro de uma narrativa inflada, torna a produção muito hermética para o seu próprio bem e confundindo a audiência.

    Enterre Seus Mortos é um filme que aparenta justificar a existência de uma chocante primeira cena, por meio de cenas violentas e uma tentativa de construção de thriller, a partir de uma investigação sobre uma iminente seita que aterroriza os sonhos de Edgar Wilson, porém, a falta de explicações básicas não auxilia.

    Apesar de um elenco de peso que inclui Selton Mello, em um de seus papéis mais fracos, Marjorie Estiano e a eterna Betty Faria, a produção aparenta ter o objetivo de construir uma reflexão sobre o bem e o mal, porém, falha em conceitos básicos como a construção de personagens e de um maior enfoque no apocalipse em si.

    Os momentos em que Enterre Seus Mortos levemente se destaca, ocorre em alguns diálogos como o de Edgar Wilson com Nete, Marjorie Estiano, porém, mesmo uma cena interessante incomoda ao durar mais do que deveria, algo que Enterre Seus Mortos é perito.

    Enterre seus mortos

    Marjorie Estiano em cena de “Enterre Seus Mortos”- Foto divulgada pelo Festival Do Rio

    A fotografia neon, misturado com um estilo faroeste, apresenta interessante a principio, porém, não se mantém dentro de uma distopia que não é explicada em nenhum momento, assim, por conta do mundo de seus personagens não terem sido devidamente apresentados, a audiência não consegue ter empatia.

    Ao final de seu segundo ato, já com parte da audiência tendo desistido de assistir o resto da produção, Enterre Seus Mortos tira um deus ex machina na forma de Gilson, um demônio que estava no controle de Edgar Wilson o tempo todo, o tornando um assassino. O que poderia ser uma virada interessante para seu protagonista, a construção deste ponto de virada é tão absurda que se torna impossível sentir qualquer forma de impacto.

    Ao final da produção, saímos com um sentimento vazio, e com grande parte do filme apagado de nossa mente, por conta de uma construção narrativa que não faz sentido, dentro de um filme que se leva a sério demais para o seu próprio bem.

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  • CRÍTICA (FESTIVAL RIO) | Abraço de Mãe constrói terror a partir de relação materna

    CRÍTICA (FESTIVAL RIO) | Abraço de Mãe constrói terror a partir de relação materna

    Dirigido por Cristian Ponce, Abraço de Mãe conta história de fantasmas para retratar a aceitação da dor.

    Ao longo do cinema de terror, diversos filmes construíram uma narrativa assustadora, tendo como base uma relação pé no chão sobre maternidade, alguns exemplos incluem: Aliens, O Resgate (1986), O Bebê de Rosemary (1968), O Babadook (2014), As Boas Maneiras (2017) e o recente Abraço de Mãe (2024).

    Abraço de Mãe conta a história de Ana, interpretada por Marjorie Estiano, uma bombeira que deve evacuar um asilo durante um forte temporal na cidade do Rio de Janeiro, durante este processo, descobre as verdadeiras intenções de seus moradores e a ligação com o seu próprio passado.

    Grande parte da produção se passa dentro de uma enorme casa, aonde o horror é construído por meio da escuridão; pelo senso de não ter para onde fugir; pela construção sonora e silenciosa do local; e por seus moradores que iniciam uma cerimônia com a chegada da tempestade, uma cerimônia que Ana já presenciou em sua vida.

    Existem duas formas de maternidade ao longo da produção, aquela que cria e aquela que cuida. A primeira foi o que Ana vivenciou em sua infância, tendo tido uma mãe que aparentava se importar, porém, apresentava outros objetivos mais obscuros que foram impedidos por um incêndio. A segunda ocorre quando Ana conhece Lia, uma menina assustada presa no asilo, e deve protegê-la do mesmo destino que quase foi seu.

    A relação entre uma mãe e uma criança, seja ela biológica ou não, é uma das mais fortes que existe, por isso é tão comumente explorada ao longo da literatura e do cinema. Abraço de Mãe explora este simbolismo diversas vezes, um exemplo é o enorme útero aonde aqueles que são capturados, são aprisionados com um cordão umbilical que alimenta um gigante bebê em estado de formação.

    Um segundo simbolismo presente em Abraço de Mãe, se encontra na relação de Ana com os 4 elementos da natureza: o fogo que matou a mãe de Ana e ao mesmo tempo a salvou de um destino cruel; a água do temporal e do líquido amniótico aonde os personagens alimentam o bebê; a mãe terra que exige este sacrifício; e o vento de um dos maiores temporais da história do Rio de Janeiro.

    Abraço de Mãe

    “Abraço de Mãe”- Foto divulgada pelo Festival do Rio

    Abraço de Mãe constrói um universo fantástico que auxilia na construção do horror. O roteiro de Cristian Ponce, André Pereira e Gabriela Capello, propositalmente não explica todas as questões relacionadas à cerimônia ou às temáticas mais fantásticas da produção, deixando o espectador tirar suas próprias conclusões sobre os acontecimentos.

    O maior objetivo do roteiro e da direção é a construção de um arco narrativo para Ana, sendo o filme conduzido pela sua personagem. Primeiramente presenciamos a sua juventude e seu trauma que a marcou para a vida, em seguida sua versão mais madura na forma de uma bombeira orgulhosa e que se recusa a aceitar a dor ou a sua própria incapacidade de agir, e ao longo da produção, o seu amadurecimento em uma pessoa que aceita a sua própria condição humana e falha, protegendo Lia e aceitando que não é possível fugir da própria dor, devendo aceitá-la.

    Com uma direção de fotografia e construção de clima exemplares, Abraço de Mãe prova como é possível fazer um cinema de terror no Brasil, o filme estreia dia 23 de Outubro na NETFLIX.

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  • CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Apesar do nome, Bruxas é um documentário muito humano

    CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Apesar do nome, Bruxas é um documentário muito humano

    Fazendo uso de material de arquivo, Bruxas constrói um retrato sobre maternidade a dor feminina pós parto.

    Bill Nichols, um dos maiores estudiosos do gênero documental, delimita o gênero em 6 tipos: Expositivo, Observativo, Participativo, Reflexivo, Poético e Performático. Bruxas, se encaixa em três destas categorias: ele é um documentário participativo, na medida que diversas mulheres, incluindo a diretora, prestam seus depoimentos sobre a dor e a agonia que sofreram após o parto; é um documentário reflexivo, ao usar imagens de arquivos de filmes diversos para construir uma linha de raciocínio que conduz toda a produção; e principalmente é um documentário poético ao agir como um estudo psicológico e um modo destas mulheres se abrirem de forma terapêutica.

    Bruxas é narrado por Elizabeth Sankey, diretora e participante do documentário. Logo em seu inicio, vemos diversas imagens de filmes clássicos do cinema que apresentam alguma forma de bruxaria, seja Macbeth, As Bruxas de Eastwick (1987), A Bruxa do Amor (2016), Jovens Bruxas (1996), entre outros.

    O principal paralelo realizado ocorre quando se é analisado o filme O Mágico de Oz (1939). Elizabeth diz que desde pequena, sempre quis ser uma bruxa, porém, uma boa como Glinda, nunca a Bruxa Má do Oeste, enfatizando a dualidade interna entre as duas personagens da produção.

    A partir deste exemplo, somos apresentados à capítulos dentro documentário, cada um tomando como inspiração um trecho ou alguma frase do Grimório das Bruxas. Em cada capítulo, entramos mais a fundo na dor e culpa que Elizabeth, e outras mulheres como Sophia Di Martino, a Sylvie da série Loki (2021-2023), sentiram e ainda sentem por estarem encabeçadas dentro de um papel de mãe que são obrigadas a seguir.

    Em uma parte da entrevista, Sophia diz que a culpa nunca vai embora, você tem o filho e depois disso somente sobra culpa. Seguindo esta lógica, o documentário segue uma linha semelhante com o que Clarissa Pinkola Éstes fez em seu livro Mulheres que Correm com Lobos, trazendo caminhos para que as mulheres se libertem de um regime social que as aprisiona, sendo a principal forma de isto ocorrer, é na forma de sororidade, afinal, muitas mulheres sofrem sozinhas por medo de não serem compreendidas.

    bruxas

    Elizabeth Sarkley, diretora e roteirista de “Bruxas”- Foto cedida pelo Festival do Rio

    Em Bruxas, Jessica discute o estigma de maternidade e a importância de se unir com o espectro de dor que ela carrega, se abrindo sobre como teve que ser internada em um hospital psiquiátrico após o nascimento de seu filho, porém, este acontecimento permitiu que ela conhecesse outras mulheres que sentem o mesmo, permitindo que ela se libertasse de parte deste sentimento, aceitando que este sentimento é algo normal a se sentir dentro de determinado contexto.

    Por meio de dados históricos como o julgamento das bruxas de Salem, quadros históricos e muitos arquivo de filmes. Acompanhamos estes depoimentos com dor no coração, porém, uma felicidade, pois, ao fim, é explorado novamente O Mágico de Oz (1939), desta vez a partir de uma nova visão: a importância de se aceitar o lado Bruxa Má do Oeste, pois, a partir dele, que a mulher consegue se encontrar, encontrar o seu coven, e se libertar de um sentimento social imposto inconscientemente na mulher há muitos anos, afinal, manter a personagem de bruxa boa por toda a vida, apesar de ser isso que se espera das mulheres, é inviável, trazendo culpa e ressentimento no processo.

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  • CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Continente é uma história de vampiro em sistema coronelista

    CRÍTICA (FESTIVAL DO RIO) | Continente é uma história de vampiro em sistema coronelista

    Dirigido por David Pretto, Continente usa o vampiro para analogia ao colonialismo

    Por grande parte de Continente, fazemos um paralelo com Bacurau (2019) de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. As semelhanças incluem: um vilarejo afastado do mundo, com moradores que tomam um remédio, cuja pessoa que protegia, acabou de falecer, e assim, após esta morte, o vilarejo começa a sofrer as consequências da morte de seu protetor.

    As diferenças entre Bacurau e Continente se encerram aí, abrindo espaço para as diferenças, como: um homem branco, e estrangeiro, que falece ao invés de uma mulher negra, sua filha francesa que retorna ao povoado com o namorado, um senso de tensão constante que somente é explicado no meio do segundo ato em diante, e vampiros.

    Continente retrata a queda de um sistema de coronelismo, em um pequeno povoado, e a substituição necessária para evitar a ruína da região. Todos trabalhavam para o antigo patriarca, todos respondiam à ele, e em troca, a cada 15 dias, recebiam seu pagamento em forma de sangue, ou seja, o patriarca sugava o sangue do morador, e vice-versa, para assim, manter a paz dentro dentro do vilarejo.

    Continente

    Cena de “Continente”- Foto divulgada pelo Festival Do Rio

    Após sua morte, a cidade rapidamente inicia um processo de auto-destruição e violência, algo que não existia durante o domínio de seu coronel, assim, todos os moradores viram ovelhas sem pastor, sem saber o que fazer. Em uma cena, que relembra os zumbis de George A. Romero, muitas pessoas, sem vida no olhar, prestam respeito ao falecido patriarca, assim, lentamente todos entram na casa e tentam sugam o sangue do corpo sem vida.

    O vampiro é um dos seres fantásticos mais discutido dentro do cinema e da literatura, cada produção tenta reinventar sua mitologia secular, seja o vampiro que brilha na luz, o vampiro atormentado, a vampira vizinha de um menino, ou o vampiro dono de um hotel. No caso da produção de Davi Pretto, o vampiro age como o dono de uma fazenda que protege todo o povoado, após sua morte, uma nova pessoa deve assumir este papel, alguém que apresenta o mesmo sangue do antigo coronel.

    Do mesmo modo que A Herança, de João Cândido Zacharias, Continente segue uma estrutura básica de filmes de horror já estruturados e consagrados mundialmente. Seu principal ocorre no clichê do retorno para casa, neste caso, na forma de Amanda, filha do patriarca que viveu 15 anos na França. Ela é seduzida pelo lugar, mesmo com todas as indicações que algo está errado.

    Continente

    Ana Flavia Cavalcanti em cena de “Continente”- Foto divulgada pelo Festival Do Rio

    Amanda aceita o seu destino e se torna a nova provedora para o vilarejo. Em uma cena extremamente erótica, suga o sangue de cada um dos moradores do local, em ambos os praticantes do ato apresentam um êxtase catártico, não fugindo da conotação sexual tão presente na mitologia de vampiros.

    Desde antes de sua mais famosa interação em Drácula de Bram Stoker, o vampiro é um estrangeiro. Nem Amanda, nem seu pai antes dela, eram brasileiros, porém, são eles que dominam a região e controlam os moradores com punho de ferro, dentro de um um sistema claro de suserania e vassalagem. Continente é um filme chocante, subvertendo um ideal patriarcal em diversas cenas, desde ele ser substituído por uma mulher, até a personagem de Helô, uma mulher, médica e negra, que recusa este sistema de soberania, porém, cede ao perceber que não existe escapatória.

    A produção é lenta em sua maior parte, porém, ao entrar de cabeça no horror do vampiro, o filme prende como poucos conseguem fazer, misturando um hermetismo em alguns momentos, um realismo fantástico em outros como uma chuva de sangue, e cenas de violência extremamente gráficas em outros.

    Continente é uma excelente adesão ao gênero de horror nacional que se encontra em rápida ascensão, usando um mito secular e conhecido, para construir analogias ideais para o nosso país.

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