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CRÍTICA| Pisque Duas Vezes é um thriller que explora o impacto da masculinidade tóxica

Pisque Duas Vezes – Um surpreendente thriller de estreia de Zoë Kravitz

Ao longo de sua uma hora e 40 de filme, Pisque Duas Vezes apresenta uma tensão da primeira cena à última, o público, como um ser onisciente e atento ao contexto social, consegue perceber diversas vezes antes mesmo da protagonista, ocasionando uma agonia que não some fácil.

Zoë Kravitz iniciou o processo de escrita de Pisque Duas Vezes no ano de 2017, na época, o filme se chamava Pussy Island, um nome que reflete sobre o período inicial que o thriller nasceu.

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No fim do ano de 2017, a indústria cinematográfica passou por um forte movimento contra o assédio sexual em locais de trabalho. O movimento #Metoo levou a destituição de Harvey Weinstein de sua própria produtora, The Weinstein Company, após dezenas de mulheres acusarem o produtor de assédio sexual durante um período de 30 anos. Tendo inicialmente negado todas as acusações, em 2020 foi condenado a até 25 anos de prisão, porém, em 2024 sua sentença foi anulada.

Weinstein não foi o único, o movimento #Metoo levou diversos homens a serem destituídos de seus respectivos cargos, sejam produtores, jornalistas ou atores como Jo Min-Ki, um ator sul-coreano, acusado de assédio por diversas mulheres que participavam do seu curso de atuação, Jo Min-Ki se suicidou um mês depois e em sua carta de suicídio ele pedia desculpas pelo seus atos.

Apesar da importância do movimento dentro de diversas camadas sociais, ainda vivemos em uma sociedade machista na qual muitos homens se enxergam na posição de usufruírem de uma espécie de anel de Giges, como Platão discute em seu livro A República, assim, podendo cometer atos odiosos de diversos tipos, porém, saindo imunes por conta do poder ou anonimato.

“Pisque Duas Vezes” é o primeiro trabalho de Zoë Kravitz na direção, apesar de apresentar algumas falhas, uma coisa inegável é a força de sua fotografia na composição de uma tensão que compõem o thriller em sua totalidade.

O filme gira em torno de Frida, Naomi Ackle, uma garçonete apaixonada por Slater King, um milionário interpretado por Channing Tatum, e que recebe a oportunidade de passar um tempo em uma ilha deserta, junto com ele e outros desconhecidos. Apesar de premissa clichê e o sentimento que o público apresenta, desde as primeiras cenas, que algo estava errado, o mistério e os horrores finais somente são desvendados ao final do filme.

Todo o elenco apresenta seu momento de brilhar, porém, o destaque é de Channing Tatum, no melhor papel de sua carreira, Adria Arjona e Naomi Ackie em um papel agonizante, passando por todas as emoções possíveis ao longo da produção.

O roteiro apresenta nítidos paralelos com outras produções do gênero, incluindo o thriller Corra de Jordan Peele, porém, isto não tira o valor que o filme apresenta, seja em seu valor estético ou em sua capacidade de chocar e deixar o espectador agoniado, em cenas com um close de uma personagem que muda sua expressão de blaze para raiva em um intervalo de 30 segundos.

Ao longo da produção, Zoë Kravitz não economiza metáforas para explorar a angústia feminina da sociedade atual, algo presente, constante em diferentes camadas sociais, porém, que continua existindo mesmo com esta consciência, seja uma síndrome de Cassandra em que por mais que elas gritem, ninguém acredita, ou os diversos assédios e liberdades que homens se enxergam no direito de tomar, somente por serem homens. O movimento #metoo foi importante justamente pelo seu impacto mundial em demonstrar isto.

Todas as camadas sociais envolvidas no movimento estão presentes no filme de Kravitz, aqueles que praticavam atos de abusos, aqueles que apresentavam consciência destes atos, porém, não agiam para impedi-los, e em uma chocante cena ao final do filme: aqueles que pedem desculpas na vida pública e mesmo assim continuam com os mesmos costumes em sua vida privada.

O filme é um thriller agonizante e uma montanha russa de emoções, trazendo reflexões, uma metódica fotografia, momentos cômicos pontuais que não destoam da tensão original da produção, um design de som arrebatador e uma direção inicial que nos fará ficar muito atento em futuros projetos de Zoë Kravitz.

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